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sábado, 2 de julho de 2011

A Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo


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“...vemos esta tendência manifestar as suas últimas consequências dramáticas, chegando quase a negar, nos fiéis que se dizem cristãos, o valor histórico dos testemunhos inspirados ou, mais recentemente de maneira puramente mítica, espiritual ou moral, a Ressurreição física de Jesus.”(Papa Paulo VI, Discurso no Simpósio Internacional sobre a Ressurreição de Jesus)
A Ressurreição de Jesus é o ponto central da nossa fé. Tendo em vista essa afirmação, o presente artigo quer apresentar – diante de tantos pensamentos sobre o tema em descrédito com a verdadeira fé – reflexões que correspondam diretamente à fé cristã e católica tendo como embasamento o tripé: as Sagradas Escrituras, a Sagrada Tradição e o Sagrado Magistério.
Religião nenhuma prega a ressurreição de seu fundador, com exceção do Cristianismo. Sendo a ressurreição um estupendo milagre de Deus, a crítica moderna põe em cheque a realidade da ressurreição de Cristo, tratando como mito ou uma fantasia e mesmo uma alucinação dos cristãos.
1 – UM POUCO DE HISTÓRIA
O racionalista Hermann Samuel Reimarus (1694-1768) no século XVIII retomou o que os judeus no princípio afirmavam, que o corpo de Jesus fora roubado pelos discípulos para que pudessem afirmar com provas visíveis a ressurreição (cf em Mt 28,11-15). A teoria de Reimarus foi rejeitada pelos racionalistas, considerada pequena e infundada, pois se fosse mentira dos discípulos em breve seria descoberta a fraude e a fé na ressurreição chegaria ao final.
Temos também depois o Karl Friedrick (1741-1792) e Eberhadt Gottlob Paulus (1761-1851) que defendiam a teoria de que Jesus não morreu na cruz e teria sido sepultado vivo. O estudioso alemão Holger Kersten aderiu esta teoria exposta acima e incrementou dizendo mais: que Jesus deixou o sepulcro e foi para a Índia onde ficou até os últimos dias de sua vida. Essas teorias são fictícias, pois são contrárias à arqueologia que aponta o sepulcro de Jesus em Jerusalém. Dá para perceber claramente que as Sagradas Escrituras dizem corretamente que um abismo atrai outro abismo. Muitos teólogos não percebem o mal que fazem com suas teorias avançadas.
No começo do século XX a chamada Escola ou (Método) da História das Formas passaram algumas idéias no decorrer da história através de estudiosos que aderiram tal escola, entre eles Rudolf Bultmann que acreditava ser a mensagem de Jesus que ressuscitara e não Ele próprio, ou seja, o milagre não seria a ressurreição de Jesus, mas a fé que os discípulos tinham.
A Santa Igreja venceu todas estas correntes, teorias, concepções, heresias... mas eis que ainda na modernidade surgem coisas surpreendentes. A Igreja nunca está tranqüila.
2 – AS MESMAS HERESIAS VOLTAM COM “NOVO ROSTO”
Na atualidade, o teólogo Andrés Torres Queiruga*, sacerdote, doutor em teologia e filosofia da religião na Universidade de Santiago de Compostela na Espanha traz uma reinterpretação da Ressurreição de Cristo. Ele pretende reformular o anúncio da ressurreição numa linguagem moderna para escandalizar menos a sociedade. É plausível a intenção de Queiruga em apresentar a fé de maneira acessível a todos, crentes e não crentes, mas da maneira como tem feito com a questão da Ressurreição de Jesus fere a fé cristã e católica profundamente, pois contraria a interpretação que a Igreja, sempre iluminada pelo Espírito Santo fez em torno da Ressurreição e das aparições do Senhor ressuscitado e conseqüentemente a Sagrada Tradição perpassada desde os primeiros cristãos. Nada na Igreja foi inventado. Tudo passa por um processo, uma investigação histórica.
Eis a tese de Andrés Torres Queiruga, (extraída do livro Repensar a Ressurreição Ed. Paulinas, São Paulo, 1994) resumidamente em forma de tópicos para facilitar a compreensão:
1 - Necessidade de reformular a fé na Ressurreição de Cristo em linguagem puramente moderna, pois cada época há uma nova exigência para a reinterpretação.
2 - A Ressurreição de Jesus não se deu na história, ou seja, no tempo, mas sim em Deus (na eternidade).
3 - Os relatos do Novo Testamento sobre a Ressurreição, o sepulcro vazio e as aparições do Ressuscitado não são históricas, mas sim fictícias.
4 – Acentua um monismo antropológico baseado na questão de que não há distinção entre corpo e alma.
Assim, faremos brevemente alguns apontamentos para nos ajudar a entender porque tal ponto de vista é contrário à nossa fé cristã e católica.
3 – ANALISANDO E REPENSANDO A TESE
Pelo primeiro tópico percebemos que na visão de Queiruga sempre haverá mudanças e que sua tese daqui a alguns anos também terá que mudar, passando por reformulações. (Daí entender os títulos de suas obras: Repensar a Criação, Repensar a Revelação e Repensar a Ressurreição). Momento então de repensarmos a sua teoria sobre a Ressurreição. Claro, não sabemos qual será a nova reformulação. Portanto, partindo desse ponto de vista não há mais verdade absoluta no campo da fé, já que é necessário de tempo em tempo reformular, reinterpretar, deixando de lado anos e anos de história, tradição e hermenêutica que a Igreja fez.
No segundo tópico podemos dizer que Queiruga tem um forte preconceito aos dogmas da fé e a modernidade, pois não pode ser REAL o que se escapa às categorias da razão humana. Veja bem: a ressurreição dos mortos é algo que não compete à filosofia, à razão, - embora a filosofia ajude a compreender a fé – mas sim à teologia, à fé. E só por isso seria colocada como algo impossível, ou seja, um mito? A verdade é mais ampla do que a razão. Existem coisas que podem existir de fato, mas que a razão não explica. E não é por isso que tais coisas deixarão de existir. A Ressurreição de Jesus não é como dizer que uma bola é quadrada, que de fato seria ilógico e irracional. A Ressurreição de Jesus é real. E o REAL é aquilo que existe de fato mesmo quando não penso naquilo. Portanto não há necessidade de pensar em alguma coisa para aquilo existir. Isto é um princípio filosófico.
Para a Ressurreição de Jesus existir não precisa da minha fé. Quero dizer que, mesmo que não creiamos, ela é um fato real.
No terceiro tópico citamos a Constituição Dogmática Dei Verbum, (DV 19) explicitando a doutrina oficial que diz que a Igreja sempre sustentou que os quatro evangelhos transmitem fielmente aquilo que Jesus realmente fez e disse. E também sustenta até hoje isto com firmeza. A Igreja afirma a historicidade dos quatro evangelhos e afirma com toda a convicção. Os apóstolos transmitiram aquilo que Jesus fez e disse. E no entender e transmitir eles foram iluminados pelo Espírito da verdade. Os quatro evangelistas escreveram sobre Jesus coisas verdadeiras. E escreveram tendo a intenção de que aceitemos como verdade aquelas suas palavras que eles e testemunhas oculares nos transmitiram.
Tudo o que os Evangelhos trazem realmente aconteceu e não são meras ficções e alienação dos apóstolos e evangelistas. A Igreja tem razões para crer e ensinar a todo povo de Deus a doutrina correta, pois esta é a sua missão de Mãe e Mestra da verdade.
O teólogo espanhol quer fazer uma reviravolta no dogma da Ressurreição de Jesus. Dá a entender que o transcendente, ou seja, o divino não pode ter acontecido da forma como foi. O pano de fundo é: o milagre (a intervenção miraculosa de Deus) não pode se dar na história. Daí afirmar que os milagres de Jesus são simbólicos, pois Deus não utiliza de coisas estupendas, não usa de sinais visíveis.
No quarto e último tópico, percebemos que Queiruga não aprova a separação corpo e alma como se a escatologia cristã pregasse o dualismo. Na verdade a escatalogia ensina a dualidade, ou seja, a complementação harmoniosa das duas e não dualismo que nada mais é do que afirmar que a matéria é má e o espírito bom. Resumindo: dualismo (negativo) e dualidade (positivo). Para sair do dualismo não se faz necessário cair no monismo como faz Queiruga. Portanto a dualidade é considerada o meio termo. A pessoa humana é um composto de corpo e alma. Pela escatologia do Magistério, a matéria é tão bela, que é por isso mesmo que ela irá ressuscitar também, unindo à alma, claro, num corpo glorioso como ensina São Paulo.
Por que não existir sinais sensíveis e visíveis aos dogmas da fé? A fé cristã sempre foi escândalo para o mundo e não é de hoje. Nosso Senhor Jesus Cristo sempre foi sinal de contradição. E a Igreja continuará sendo esse sinal de contradição por ser fiel ao mandamento do Senhor de ensinar somente a verdade, pois ela é a única que liberta. Se cada vez que notarmos que o mundo evoluiu e tivermos que adaptar as questões de fé para a modernidade estaremos perdidos.
Para pensarmos: quando o Apóstolo Paulo quis na sua época, em Atenas, realizar uma pregação, ele foi muito bem acolhido, ouvido, aplaudido por que não, até que chegou à temática da ressurreição. E aí, os ouvintes dispersaram e se foram. A Ressurreição de Jesus sempre escandalizou e nem por isso a Igreja a distorceu como fez e faz tantos pensadores do passado até hoje.
Desde os primórdios da Igreja, nunca se deu brecha para mitos e historinhas fictícias. Mesmo entre os judeus convertidos ao cristianismo eram contra os mitos pagãos.
Um dos principais textos do Novo Testamento que fundamenta a Ressurreição é o de São Paulo em 1Cor 15, 3-8. São Paulo escreveu tal passagem no ano 56, pouco mais de vinte anos após a Ascensão de Jesus segundo Dom Estêvão Betencourtt. As frases de Paulo nesta perícope são curtas e incisivas. As expressões “conforme as escrituras e apareceu” destacam entre as demais.
Percebemos de forma muito clara a verdadeira profissão de fé na ressurreição física de Jesus como realidade histórica. E para melhor comprovar diz o Apóstolo que havia testemunhas oculares das quais muitas ainda viviam vinte poucos anos após a Ressurreição de Jesus.
“Seriam incompreensíveis o êxito e a força da pregação dos Apóstolos se depois de haverem feito a dolorosa experiência da Paixão do Mestre, não o tivessem visto realmente ressuscitado.” (Bettencourtt, Estêvão. A Ressureição de Jesus. PP. 13 e 14). Sem o encontro com o Cristo vencedor, também não se explicaria a Cristologia pascal (a doutrina do Cristo morto e vivo novamente) da Igreja antiga.
Os Apóstolos eram homens rudes que não teriam a capacidade de inventar a Ressurreição de Jesus. A idéia deles era muito limitada. Sem o encontro vivo com a pessoa física de Jesus não existiria pregação tão incisiva principalmente a da martiria. Comenta Bettencourt que a própria conversão de Paulo de Tarso é de se pensar que sem a realidade da Ressurreição de Jesus seria difícil de perseguidor tornar-se mensageiro da boa nova. Apenas uma experiência mística não seria suficiente para enfrentar e viver o que a Igreja nascente enfrentou e viveu de forma incisiva e com grande convicção a ponto de derramar sangue.
Todos os Apóstolos foram mártires – exceto São João, embora seja considerado – por causa da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Quem é que inventaria uma mentira absurda que prejudicaria e muito a sua vida a ponto de levá-la para o aparente fim?
O pensamento de Queiruga nada mais é do que afirmar que Deus não interveio na história de forma inteira. Ao chegar o ponto alto da nossa fé, que é a Ressurreição, se torna algo distante, longe, irreal... e toda a fé cristã de mais de dois mil anos fica ao léu, e o vento levou, a Igreja inventou e nada disso é assim.
Sem contar que desta forma como Queiruga apresenta a Ressurreição parece querer incutir uma Teodicéia racionalista, como se Deus para ser Deus de fato, isto é, para existir, não pode agir ou se manifestar sensivelmente no tempo e no espaço.
Na maioria das vezes é a visão de mundo que está errada, pois afirma sem hesitação que tudo precisa ser explicado. Portanto nem tudo precisa de ser explicado de acordo com a visão de mundo, como por exemplo a nossa fé, pois quando se reduz tudo a mecanismos históricos que são automáticos, de certa forma se tira aquilo que é belo, forte e surpreendente: a mão de Deus que é Pai e vem nos socorrer.
Não é escandaloso afirmar que a ressurreição de Jesus se deu na história, já que a história da salvação do povo de Deus se deu na história. A revelação de Deus aconteceu na história. Na plenitude dos tempos, Deus – infinito amor – (Gl 4,4) interferiu na história falando conosco, caminhando conosco...por meio do seu único Filho Jesus Cristo.
Parafraseando Pe. Paulo Ricardo, a Ressurreição de Jesus é um irromper da escatologia dentro da história, ou seja, uma antecipação da vida eterna que acontecerá com cada um de nós no fim dos tempos. No entanto é preciso observar que a ressurreição do Senhor foi totalmente singular e em relação a Nossa Senhora também.
Uma observação importante a fazer é que pela leitura dos Evangelhos, notamos que as vezes em que Jesus aparece, suas aparições não são precedidas de ansiedade da parte dos Apóstolos ou discípulos, mas sim são inesperadas, surpreendentes.
Se a Ressurreição de Jesus, da maneira como a Igreja sempre a entendeu, fosse inventada, como dizem alguns teólogos (afirmando que os relatos evangélicos são explicados corretamente pela “nova” exegese) seria uma invenção bem feita e não como esta que conhecemos. Entendendo: Quem inventa uma mentira, a inventa para todo mundo acreditar e não só para alguns. Se assim fosse eles não teriam colocado que Jesus apareceu primeiramente a mulheres, mas sim para homens, pois as mulheres naquela época não eram testemunhas de praticamente nada. Os inimigos de Jesus não negaram o sepulcro vazio, apenas interpretaram de outra forma.
A Tradição sempre viu como referência histórica a questão do túmulo vazio bem fundamentada. O mesmo que morreu na cruz é o mesmo que ressuscitou e possui o mesmo corpo embora de forma diferente (corpo glorioso) como define São Paulo. Jesus ressuscitou como novo Adão, na mesma matéria corpórea.
A Ressurreição de Cristo aconteceu no tempo e no espaço e por este motivo deve ser vista como um fato histórico, embora transcenda à própria história.
Ter fé na Ressurreição de Jesus como fato real, que se deu na história não é assumir uma fé imatura, infantil, como se não soubéssemos nada de teologia, exegese, hermenêutca... ou coisa parecida. Ter fé na Ressurreição é uma questão realmente de fé, fé esta que se baseia na doutrina da Igreja de Cristo que é fiel aos ensinamentos de Cristo e portanto esta fé é razoável, inteligente, madura o suficiente para crer com toda a convicção de que Jesus está realmente vivo. A fé se comprova aos poucos à medida que nós caminhamos. Não fomos enganados pelos ensinamentos da Igreja durante anos. A fé de hoje é a mesma de ontem, ou seja, do passado e será a mesma do futuro.
A partir dos estudos do Pe. Paulo Ricardo analisemos alguns critérios importantes:
As aparições de Jesus nunca são idênticas entre os quatro evangelhos nos pequenos detalhes. Diante deste fator só deve aumentar a credibilidade dos relatos evangélicos, pois é chamado princípio da múltipla testação. Se o evangelistas relatam substancialmente a mesma coisa, porém essas mesmas discordam em pequenos detalhes é sinal de que essas coisas não copiaram um do outro e que portanto, se os evangelistas não copiaram um do outro, nós temos uma múltipla testação, ou seja, temos várias testemunhas dizendo a mesma coisa. Quando se entrevista quatro testemunhas a respeito de algum acontecimento e coincidem na substância dos fatos é porque é verídico.
A Ressurreição é muito mais que um milagre. É um acontecimento milagroso (no sentido de que não há explicação na natureza) e, portanto foge do campo da filosofia, embora, a filosofia também pode contribuir para afirmá-lo.
Encerro com as sábias palavras de Dom Estêvão Bettencourt: “A fé cristã poderá, por vezes, parecer loucura e escândalo, mas será sempre a Sabedoria de Deus portadora de salvação para quantos a aceitam.”
*o autor é Professor de Filosofia e Educação Religiosa. Estudou Teologia e concluiu até o 2º ano. Estudioso de Cristologia e Mariologia.
*Lembramos que o presente artigo não quer em hipótese alguma ofender o referido teólogo espanhol. Mas quer antes de tudo explicitar a doutrina concernente à Ressurreição de Jesus de acordo com os ensinamentos do Magistério Eclesiástico, mostando que Queiruga pensa de maneira diferente (e tem direito de fazê-lo) mas não é o modo de ensinar oficial da Santa Igreja, de modo que ele nunca fale em nome da Igreja - a não ser que envolva a sã doutrina - pois seu pensamento não é compatível com a verdade ensinada pelo Magistério da Igreja.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BETTENCOURT, Estêvão. A ressurreição de Jesus: ficção ou realidade?. Escola Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro.
PERGUNTE E RESPONDEREMOS. Repensar a ressurreição. Número 515,p.193. ano 2005. Edições Lumen Christi.
30 DIAS. A ressurreição física de Jesus. 2008.

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