Por Fulton Sheen
"São de três aspectos as diferenças principais entre o ascetismo difundido pelo fascismo soviético e o ascetismo cristão.
Em primeiro lugar o ascetismo comunista é imposto, o ascetismo cristão é voluntário
Consideremos a propriedade privada. Nem os comunistas nem as carmelitas a possuem. Há ascetismo de posse em ambos os casos. Tempo houve em que ambos possuíram uma propriedade. O comunista viu-se espoliado da sua; a carmelita renunciou à sua. O comunista viu-se "obrigado"a fazer o voto de pobreza, isto é, não pôde possuir propriedade produtiva, enquanto a carmelita fê-lo por sua própria vontade. A renúncia no primeiro foi ordenada; no segundo foi de espontânea vontade.
O fascista soviético de Moscou que rebe hoje um magro salário numa fábrica de parafusos e porcas não olha para a loja que era sua em 1917 daquele modo que a carmelita olha para a sua casa. Volta-se para sua loja pesaroso e bem desejaria poder novamente ser responsável pela propriedade produtiva. Com a carmelita é diferente. Anos atrás, quando o claustro foi aberto á visitação, uma das visitantes apontou para uma bela casa.lá no outro lado do vale, casa então pertencente ao rico proprietário de um jornal. "Irmã, disse ela, se antes de vir aqui lhe tivessem dado aquela casa para morar, com todas as coisas que há nela, te-la-ia rejeitado pelo Carmelo coma sua Cruz?" Respondeu a Irmã: " Era aquela minha casa".
O comunismo não confia na propriedade privada, portanto,diz ele, ninguém deve possuí-la. Todos tem de fazer o voto de pobreza. Tal ascetismo é a morte da liberdade.
Jesus Cristo recomendou ao moço rico que vendesse tudo o que tinha e desse tudo aos pobres, mas não lhe tirou à força seus bens. O comunismo não confia na democracia, pois só admite um único partido, ao qual todos tem de se submeter. Bem diferente foi o apelo do salvador, que disse aos Apóstolos que O seguissem, mas não prescreveu os discípulos de Cafarnaum como" trotsquistas", por se terem recusado a acompanha-lo outra vez, ou por terem achado suas palavras " duras".
O comunista não acredita em Deus, portanto, ninguém deve adorar a Deus. Impõe o ateísmo como o último ascetismo do espírito humano e nega, no art 124 da sua Constituição, a liberdade de pregar a religião. Jesus na Cruz, em frente aos inimigos da religião, não os feriu de morte mas orou por eles,pois não sabiam o que estavam fazendo. Deixava aos homens a liberdade de serem irreligiosos,mas os irreligiosos comunistas não deixarão aos homens a liberdade de serem religiosos.
O ascetismo do comunismo não deixa nada à livre escolha; tudo é imposto pela força. Aos demais rasgam-lhes as roupas, deitam-lhes cinza na cabeça,castigam-lhes o corpo e convertem a nação num enorme manicômio onde todos tem de cumprir os votos sem nunca os terem feito. É muito semelhante ao calvinismo que afirmava que o homem estava destinado ao céu e ao inferno, independente de seus méritos. Como Deus o predeterminou, seu destino é, por isso mesmo, indiferente ao seu bom ou mau procedimento. Em tal fatalismo, o homem não tinha liberdade de ser um santo ou de ser um demônio. Deus fez dele o que ele é, não ele próprio.
O comunismo é também semelhante à Proibição. Os proibicionistas não gostavam do copo de vinho ao jantar, por isso decidiram que ninguém mais devia tomar vinho. Há um fio comum ligando-os todos: Puritanismo sem danças, Proibição sem vinho e Comunismo sem propriedade. Todas as massas tinham de fazer os " votos" dos líderes, quer quisessem quer não. Em vez de perguntar ao homem: " Queres receber esta mulher como tua esposa legítima?", o novo ascetismo diz: "Receberás esta mulher como tua esposa legítima". Diante do problema do abuso, destruíram o uso, e face a face com a realidade do egoísmo humano, tiraram a liberdade dos demais. Tal qual certos vegetarianos que recusam carne a quem quer que seja, o comunismo empurra suas opiniões pela garganta dos demais, expediente que só aproveita aos não-ascéticos líderes vermelhos do novo ascetismo.
A Igreja afirma que, quando forçado,o ascetismo converte-se em tirania.Jesus nunca andou obrigando os homens a carregar uma Cruz porque teve a sua para carregar, nem nela os pregou porque desejou ser crucificado, nem arrebatou esposas e mães dos maridos e filhos porque não tinha família,nem acabou comas bodas porque não teve a sua, nem forçou os demais a dormirem sob os céus nublados porque não tinha teto. Todos estes atos de renúncia, Ele os deixava à liberdade de escolha de seus discípulos, dizendo-lhes: "Achais que podeis beber deste cálice?"
Não se dá o mesmo com o ascetismo moderno. Ou fazemos o que o ditador impõe ou não fazemos nada; ou temos certa espécie de sangue circulando em nossas veias ou o nosso sangue não pode de modo algum circular, dentro das fronteiras de seu império; ou aceitamos o Estado como Igreja, ou sofremos consequência de fazer política com a nossa religião; ou usamos a nossa palavra e a nossa imprensa para propagar as suas doutrinas, ou somos relegados para o supremo esquecimento da morte.
A liberdade termina onde começa a força. Benéfico e e útil é praticar a disciplina e a mortificação, mas se não deixarmos a cada qual a liberdade de fazê-lo destruiremos o seu valor. Um voto de obediência obtido à força não é voto que obrigue, do mesmo modo que a promessa de casamento feita diante do cano de uma espingarda, não é um contrato válido.
A restauração do ascetismo é um empreendimento que devemos ardentemente desejar, mas este último estado será pior que o primeiro se não deixarmos sua escolha livre assentimento do homem. Arrebatar à força as esposas dos maridos não é o que vai torna-los castos, assim como confiscar a propriedade produtiva não é o que vai libertar os homens da paixão da cupidez. É de disciplina voluntária que o mundo precisa, não de disciplina imposta. A Igreja, por exemplo, reconhece a santidade de Simão, o Estilita, que passou a maior parte de sua vida plantado no topo de uma coluna de mármore, longe do bulicio dos homens, mas a Igreja nunca disse que todo o homem que desejar ser santo deve morar num pináculo de um arranha-céu.
A Igreja canonizou a Little- Flower (Santa Teresinha), mas recusa-se a obrigar qualquer mulher a entrar no convento A Igreja ensina que a castidade dos religiosos é superior ao estado matrimonial, mas condena quem diz que o Matrimônio é um mal. A Igreja regozija-se com seus filhos que fazem o voto de pobreza e renunciam aos seus próprios bens de produção, mas condena o comunismo, que diz que a propriedade individual da propriedade produtiva é um mal. A Igreja ensina a temperança e louva o perfeito abstêmio, mas repele o reformador que diz que a bebida em si mesma é intrinsecamente má.
Santo Tomás em Becket usava, como Arcebispo, uma camisa de pelos sob os paramentos de ouro e carmesin, em seu proveito a camisa de pelos e em proveito do povo o ouro e carmesin, mas nunca vestiu à força camisas de pelos nas ovelhas de seu aprisco. Em resumo, o ascetismo comunista por ser forcado, é despojamento; o ascetismo cristão, por ser voluntário, é libertação"
Fonte: O problema da Liberdade. - Pags 214 - 215
FONTE ELETRÔNICA;
Nenhum comentário:
Postar um comentário