A SENSACIONALIZAÇÃO DA FÉ
Numa era de sensações, na qual tudo tende para o fantástico e sensacional e na qual aquilo que não é sensacional deixa de ser notícia, as igrejas resolveram aderir… São milhares os pregadores de sensação que desemboca em fé sensacional.
A maioria está nos templos, mas há os que atuam diante de holofotes e câmeras. De fato, a fé não é coisa pouca, nem o céu coisa de somenos. Não deixa de ser sensacional pensar que, um dia, veremos Deus e que, já agora, ele faz milagres diante de nossos olhos, atende nossos pedidos e nos dá recados em cima da hora, pela boca de um novo profeta, apóstolo ou sacerdote seu.
Alguns até aceitam oferecer seu suor como sinal da presença de Deus naquele evento. Se Pedro podia, por que não um novo apóstolo? Que há de mal nisso? Será que Deus ficou preso lá atrás? Por que Deus não agiria pela sombra e pelo suor de algum novo apóstolo? È um dos argumentos…
Não é sensacional saber que Deus age lá no nosso templo e em plena televisão pelo seu novo apóstolo que opera curas inimagináveis? Não é maravilhoso constatar que a era dos milagres voltou? Não é sensacional que homens comuns expulsem o demônio da dengue, da diarréia e da unha encravada?
Duvide quem quiser e creia quem quiser, mas, se acontecer, quem duvida está por fora e, mesmo que não aconteça, quem duvida continua por fora, porque pelo menos aconteceu a grande motivação em alguma vida. Só a idéia de Deus já é suficiente para mudar uma vida. Então, porque por reparos a algo que só traz o bem? O reparo não está neste bem,mas no que vem com este bem. É o que na Igreja católica se chama de badulaques da fé.
Jóia é uma coisa e badulaque é algo parecido, mas apenas parece. Está em curso, há anos, uma nova sensacionalização da fé como aconteceu em séculos passados, levada adiante por pregadores que garantem graças, milagres e curas mediante determinadas preces, ofertas ou correntes de preces. O fiel não queira receber os benefícios, se não fizer a sua parte!
Aquele show tem um preço! Tríduos, novenas, trezenas, campanhas e correntes de prece podem ser coisa boa. Mas sensacionalizadas com garantia de resposta imediata de Deus tornam-se manipulação da fé. Dízimo se aceita, mas milagre não se condiciona ao dízimo.
Nem todos os pregadores vivem este lema. Pregações que recorrem a sinais, roupas diferentes e jeito diferente de falar podem até ser boas. Ao menos tiram o sono dos fiéis. Botas-espora, chapéus de cowboy, gravatas de rancheiro, Bíblia na mão esquerda e laços e chicotes na mão direita para expulsar o demônio, socos na mesa, lágrimas sentidas, gritos lancinantes do pregador para demonstrar autoridade, piadas engraçadíssimas, tudo isso pode até surtir efeito. E sempre há quem goste da encenação.
No tempo de Ezequiel e de Amós, e do profeta cristão Ágabo, que encenaram suas mensagens, houve quem gostasse… Mas toda sensacionalização tem seu risco. Dose excessiva de fármacos pode levar ao oposto da cura. Dose excessiva de teatralização da mensagem pode acabar em ridículo e em descrédito. Há um mínimo de decoro inerente à Palavra de Deus que o pregador não pode ignorar.
O perigo da sensacionalização, garantização, certeza de que acontecerão curas, milagres, intervenção de Deus, é o de levar a uma fé “toma lá dá cá”. É fé mais “pague e pegue” do que fé “pegue e pague”! O fiel acaba dando seu dízimo para o templo e para o pregador, mas não necessariamente para Deus que certamente aceitaria bem menos do que alguns pregadores sensacionalistas aceitam.
Dias atrás, ouvi pelo rádio, um pregador a dizer que dar menos de cinco reais é uma ofensa à majestade do rei Jesus. Majestade de quem? Se isto não é sensacionalizar e instrumentalizar a Palavra de Deus, é o quê?
Às vezes, a impressão que fica é que o fiel paga mais pelo espetáculo do que pelo conteúdo…
Acontece que a fé pode, em alguns momentos até ser espetacular, mas está longe de ser espetáculo. Nem tudo o que vem de Deus tem que ser circense, visual ou delicioso de se ver.
Se a palavra “espetáculo” traz embutido o verbo ver, a palavra fé em grego bíblico, pistis, traz consigo o conceito de confiar.
Confiar é não precisar de provas, nem ver, nem tocar, nem sentir, nem ter sensações para crer… Creio no vento, mesmo quando ele não balança as copas das árvores e não sopra no meu rosto. Em algum lugar ele está soprando. Não tem que ser no meu quintal… É assim a graça de Deus.
Não precisa acontecer no meu templo nem comigo para eu crer que ela existe…
Padre Zezinho.
FONTE ELETRÔNICA;
Nenhum comentário:
Postar um comentário