Sabe-se muito pouco nas escolas e universidades sobre a vida de Galileu Galilei, suas premissas e o motivo pelo qual a Santa Inquisição o interrogou. Tal hiato concede margem para que alguns ateus e outros hereges lancem mão de violentos ataques, acusando a Santa Inquisição de terrível erro e catastrófico resultado. Escuta-se também, sempre em tom de ironia, que ninguém poderia questionar a Igreja sem cair nas malhas da Inquisição; o que é verdadeiramente falso ao que veremos a seguir.
Inicialmente temos de entender o que era a Inquisição, qual foi seu papel e em que ela revolucionou para poder formular qualquer juízo sobre o caso de Galileu. Para isso, usaremos do mesmo processo que os historiadores ateus gostam de utilizar: a desconstrução. E desconstruir implica a apresentação de contra-provas, algo muito positivista (empírico, que necessita de provas) que, por incrível que pareça, os historiadores atuais que tanto clamam o sentimento, a subjetividade histórica e a crítica ainda não abandonaram. Mas sobre o último fato, nada mais ocorre do que uma inútil redundância que somente consome o tempo dos estudantes, dado que tal reflexão filosófica não leva a nada senão a teorias esdrúxulas e devaneios; somente a isto!
Ora, se existe algo em que a Inquisição permaneceu fiel fora a etimologia de seu próprio nome: Inquirir; e este era seu papel principal, buscando compreender os pensamentos dos quase-sempre hereges que tentavam enganar as almas e tira-las, em movimentos por vezes maciços, do caminho do céu. Somente inquirir e demonstrar o caminho da verdade.
Em comparação com o antigo método que constituia verdadeiro primitivismo, a Inquisição era o paraíso, sendo por vezes aclamada por aqueles que eram presos pela Inquisição Secular, como tão bem fica demonstrado em livros e relatos de época. Não tenho o menor medo de proferir a seguinte afirmação: A Inquisição Secular era algo mais próximo do inferno que algum acusado poderia chegar.
E já que lembramos da Inquisição Secular, aproveitemos o ensejo e falemos sobre o que era ela, de modo que não passe por despercebida mas que também não se aprofunde ao ponto de se esgotar matéria sobre o assunto, dado que trataremos da Inquisição do estado mais tarde. Continuando, o método antigo para julgar-se civilmente os crimes e seus acusados era simples e ineficiente: Geralmente tomava-se os acusados e os colocavam à nadar em rios caudalosos ou a boiar sobre barris de madeira, ou ainda, a disputar espécies de “duelos”, sendo que ao final, aquele (s) que sobrevivesse (m) era por proteção divina e por isso inocente. É evidente que este verdadeiro “teste” da presença de Deus quase nunca dava certo. Tal modo de julgar ainda não era a maneira de julgar da Inquisição Secular, inquisição esta que já era presente em quase todos os países europeus antes da iniciativa da Santa Inquisição (da Igreja Católica); sua metodologia consistia na tortura dos acusados a fim de extrair dos mesmos uma possível confissão do crime cometido.
Tal inquisição fora iniciativa dos estados, e, sem querer cair em maniqueísmos dos quais já me acusam, pode-se dizer que foram iniciativas cujo fulcro era bom e idôneo. Então, por que tal afirmativa? Ora, sabemos que as coroas ainda possuiam ligação com a Igreja e desejam imprimir zelo no combate a infidelidade religiosa e à heresia; contudo, com a cooptação deste modelo que visava não só julgamento de crimes religiosos, mas também de crimes seculares, logo se abriu uma enorme lacuna judiciária em que a metodologia para se extrair os relatos criminais era a simples tortura.
Por zelo da Santa Igreja, os crimes religiosos (heresias, bruxarias e etc.) que até então não eram dissociados dos crimes comuns (roubos, assassinatos e etc.), passaram a ser julgados por uma Inquisição própria a fim de prevenir que tais métodos viessem a engrossar a fileira dos inocentes que eram mortos. Desde cedo ficou muito claro a todos que a tortura não conseguia extrai a verdade, dado que sob persuasão por meio da dor qualquer acusado (a) professa as mais deslavadas mentiras a fim de que pare a sessão de tortura. Isso ja se sabia e era muito evidente; não era possível que tal fato não fosse manifesto em um contexto avançado como o medieval. Mas vejam, consideram (claro, os ignorantes) que a Idade Média era tão primitiva que não conseguiria perceber isto; consideram que ela era tão bruta e desprovida de sapiência que não veria a decrepitude destes métodos a ponto de utiliza-los em processos da Inquisição, que, como o próprio nome diz, somente inquiriam os acusados e tentavam aliviar sua penas. Pobres pensadores…
Se existiram estruturas fixas que hipoteticamente trairiam a natureza nômade do tribunal, não passavam de “escritórios” ou “juizados” centrais que necessitavam de ampla estrutura que não poderia deixar de ser fixa, ao que ocorre por exemplo em prédios da Espanha que até o presente momento estão de pé. A natureza dos tribunais, que fique claro, era temporária, convocada somente em períodos esporádicos e regiões determinadas. Os processos consistiam em modernas defesas com advogados (garantidos a ambas as partes, mesmo com a falta de divisas de algum) e refinada apuração dos fatos. Quem julgava não poderia deixar de ter cursado alguma matéria de direito, sendo que a grande maioria era Mestre ou Doutor, ou seja, de especial mérito para que exercesse tais cargos. Existia um tempo de indulgência em que o auto-detrator, aquele que se acusava de heresia por motivos de arrependimento, quase sempre era absolvido; senão, quando condenado, recebia penas menores do que na Inquisição Secular, ou seja, geralmente era condenado a usar hábitos perpétuos, realizar peregrinações, ou ser executado simbolicamente o que se chamava de execução em efígie (um boneco era executado no lugar do réu, para demonstrar de maneira simbólica o ato de execução) ao que após a execução o réu era simplesmente liberto. E não nos enganemos, pois, a grande maioria dos julgamentos era executada em efígie por diversos motivos: morte do acusado, desaparecimento do mesmo (fuga do processo), embargos em penas e etc.
Mas, e Galileu como se insere nesta história? Galileu Galilei, nascido italiano em Pisa e falecido em Florença, era um Físico, Matemático, Astrônomo e Filósofo. Aperfeiçoou vários instrumentos de navegação e astronomia, tais quais o telescópio (que na verdade fora inventado pelo mesmo) e a bússola militar. Era amigo pessoal do sapientíssimo papa Urbano VIII.
No que tange à vida pessoal do supracitado cientista, nada apontava para uma ortodoxia católica: Galileu gerou três filhos fora do casamento com uma senhora chamada Marina Gamba (Virgínia em 1600, Lívia em 1601 e Vincenzo em 1606). Das duas filhas, encaminhadas ao Convento San Matteo em Arcetre, uma permaneceu em estado perpétudo de santidade, enquanto a irmã apontava vocação matrimonial. Vincenzo fora legitimado e permaneceu em vida proba. (Artigo sobre Galileu Galilei. Wikipédia em http://en.wikipedia.org/wiki/Galileo_Galilei#Early_life. Acessado em 03 Março de 2011) Contudo, é indubitável o fato da catolicidade permanecer na família de Galileu, dado que até o presente momento, depois de séculos de toda esta história, ela é Católica e permanece fiel ao que a Igreja ensina com toda sua sabedoria de Mater. Embora Galileu tenha pecado algumas vezes, a Igreja acolheu e continua acolhendo maternalmente sua família até o presente momento, fato indubitável.
O geocentrismo não era uma verdade de fé, um dogma estabelecido pela igreja. De fato a bíblia induzia a se pensar que a terra era o centro do mundo, contudo, com a mais livre interpretação teológica pode-se aferir que no sentido de que o homem é a mais perfeita criação de Deus colocada na terra, desta maneira, pela singularidade do habitante desta e das belezas da criação de Deus, importava ao homem definí-lo simbolicamente como centro do universo. Em termos astronômicos a conversa é diferente, pois, Galileu não conseguira provar que a terra era o centro do universo, confirmando a tese de Copérnico e inserindo uma discussão que mais decai para confrontação religiosa do que explicação científica. São Belarmino, o mesmo que advertiu Galilei de suas afirmações perigosas, sem provas, afirmava ao padre Foscarino em 1616 por meio de uma missiva que só acreditara no geocentrismo com algum tipo de comprovação:
“Em terceiro lugar, eu digo que se houvesse uma demonstração verdadeira de que o Sol está no centro do Mundo e a Terra no terceiro Céu, e que o Sol não circula a Terra mas a Terra circula o Sol, então, teria-se de proceder com grande cuidado em explicar as Escrituras, na qual aparece o contrário. E diria antes que nós não as entendemos do que, o que é demonstrado é falso. Mas, eu não acreditarei que exista tal demonstração até que esta me seja mostrada”.²
Ainda:
“Uma coisa é provar que se salvam as aparências supondo que o Sol está no centro do Mundo e que a Terra está no Céu; outra coisa é demonstrar que na verdade o Sol está no centro do Mundo e a Terra no Céu. Creio que a primeira demonstração pode ser dada; mas duvido muito da segunda; e, em caso de simples dúvida, vós não deveis abandonar a Escritura tal como ela foi exposta pelos Santos Padres. . .”³
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