top

create your own banner at mybannermaker.com!

sábado, 31 de julho de 2010

A PEDRA SOBRE A PEDRA

Em duas das minhas viagens pelo Espírito Santo, encantei-me com uma pequena pedra pousada em posição precária sobre uma enorme pedra, como se estivesse para cair a qualquer momento. Mas está lá, equilibrando-se há séculos. Até agora ninguém a derrubou. Um dia algum vândalo o fará! Infelizmente! Já sabemos que eles existem e adoram demolir, pichar e implodir. É sua marca registrada: passam destruindo e emporcalhando o que podem e como podem!
Mas, mesmo que seja derrubada, o mero fato de aquela pedra ter estado lá há tanto tempo, enfrentando a ação do vento e os tremores de terra, já terá sido uma catequese. Ruim será para o vândalo que a derrubar. Terá derrubado um monumento e não sei se haverá mérito ou justificativa para tamanho desequilíbrio.
A cúpula
Das mais de quinze vezes que passei por Roma, penso que pelo menos nove delas me levaram à basílica de São Pedro. Filmei, fotografei e meditei diante da colunata de Bernini e daquela cúpula. As colunas externas ao templo parecem dois braços abertos a acolher o povo católico e quem mais vier orar com o papa. Sobre elas repousam as imagens de inúmeros santos, como a dizer que eles nos abraçam e acolhem com a Igreja Católica.
Mas o que filmei e olhei diversas vezes foi a inscrição com letras de 1,80m que dão a volta na base da cúpula. Tu es Petrus et super hanc petram aedificabo ecclesiam meam et dabo tibi claves regni caelorum. (cf Mt 16,18-19 ) Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e dar-te-ei as chaves do Reino dos Céus. Sendo católico é claro que acredito e dou valor ao significado daquela inscrição. Respeito quem discorda, assim como espero ser respeitado na minha visão de católico.
Que pedra, que nada!
Alguns questionam e outros aceitam que a basílica está construída sobre o túmulo de Pedro. Também há irmãos que questionam o papel do papa e da Igreja católica como pedras erguidas sobre a pedra fundamental que é Jesus. Mas para mim, que sou católico, esta é a leitura!
Simão filho de Jonas, Pedro, rocha, pedra, repousa equilibrando-se sobre a rocha forte que é Jesus. ( Mc 14,72) A base não é Pedro, nem é a Igreja, é Jesus:
E assim para vós, crentes, é preciosa, mas, para os rebeldes ela é a pedra que os edificadores reprovaram. Mas foi a pedra angular e pedra de tropeço e rocha de escândalo, para aqueles que tropeçam na palavra ( 1 Pd 2,7-8)
Nunca lestes nas Escrituras: A pedra, que os edificadores rejeitaram, essa foi escolhida como pedra fundamental; pelo Senhor foi feito isto, E é maravilhoso aos nossos olhos? (Mt 21, 42)
E beberam todos de uma mesma bebida espiritual, porque bebiam da pedra espiritual que os seguia; e a pedra era Cristo. (I Cor 10, 4)
Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina; (Ef 2, 20)
Como católico leio e vejo que, na basílica de São Pedro, o importante não o possível túmulo debaixo dela, mas o sacrário no lugar central. É lá que os católicos se reúnem. Muitas vezes à frente da basílica. O centro não é o túmulo. É o altar!
Mas na basílica o simbolismo é claro: sobre Cristo ergueu-se a Igreja que nele se equilibra fragilmente, há séculos. Somos humanos e em todas as missas pedimos no Kyrie e no Cordeiro de Deus, a piedade do Senhor. Para nós, o homem chamado Simão e apelidado Pedro teve que fazer isso. Errou, mas achou sua força e seu equilíbrio em Cristo e por ele deu a vida; segundo reza a Tradição, morreu crucificado de cabeça para baixo, por entender que não mereceria morrer de cabeça erguida como seu Senhor!
É desse Jesus, pedra angular do Reino de Deus ( Ef 2,20; 1 Cor 3,12) rocha sólida e sobre o qual equilibram-se precariamente as comunidade de fé, que se ocupa a cristologia católica. Não é bom que balancemos ao saber do vento sobre o Cristo que nos sustenta, porque, como no caso da pedra sobre pedra, corremos o risco de rolar colina abaixo.
Outros conceitos
Outras igrejas têm suas interpretações. Não seriam outras igrejas se não as tivessem. Para elas, Pedro não é pedra e os católicos não se assentam sobre a pedra Jesus. Eles, sim! O discurso é de confronto! Para muitas, nós católicos já rolamos ladeira abaixo. Mal sabem elas que cada nova igreja nasce portadora desse frágil equilíbrio e que, se não sossegar o facho e não achar seu ponto de equilíbrio em Jesus, vai rolar mais depressa do que nós. A história do cristianismo é inconteste. Milhares de novas pedras não conseguiram ficar muito tempo sobre a rocha Cristo... Valeu mais o carisma e a palavra de algum ousado pregador do que Jesus, o fundamento!
A teologia da Pedra Viva e das pedras sobre a pedra viva passa pelo ecumenismo. Se não o fizer, acabará rolando para alguma fenda da História. A palavra é solidariedade, que vem de solidez: sólidos em grupos, solidários em Cristo!
padre zezinho

OSIRIS, ODIN E JESUS

Demonstrando algum conhecimento de mitologia ela me trouxe recortes de uma revista esotérica que comparava Osíris, o senhor do submundo e da vida eterna e Jesus, o Senhor dos mundos e da via eterna. Segundo a mitologia egípcia, Osíris tornou-se importante depois que ressuscitou. Fazia par com a deusa Isis, sua irmã e sua esposa. Nos dias de hoje seria um incestuoso. Segundo o mito todos os faraós se tornariam Osíris depois da morte. A superação de Osíris que também foi esquartejado e remendado inspirou os mortais a desejarem a vida eterna.
Deixou o texto e foi embora. Dois dias depois me telefonou para saber o que eu achava das semelhanças. Falei-lhe de outras semelhanças em todas as mitologias e disse que o texto em nada mudava minha convicção de que Jesus é Deus. Falei de Cronos, o deus tempo que engoliu os filhos que mais tarde foram vomitados por interferência de Zeus ou Júpiter e por Métis, a deusa prudência. Falei de Vivasvat e Saranya, Vishnu e Shiva, Odin que sacrificou um olho em troca de sabedoria, porque toda sabedoria tem um preço. Falei de Ometeotl, de Huracan, de Viracocha e Mamacocha, de Tupã, de Tangaroa, de Thor, de Urano e de Hera, de Gaia, Poseidon, de Hades. Acentuei que cada povo tinha nomes e funções diferentes para seus deuses e deusas. Todos profundamente ligados à natureza e seus fenômenos e à busca do imanente e do transcendente. Lembrei que os povos contavam a história do universo endeusando o que viam, mas não compreendiam: chuva, tempestade, astros, ventos e luzes no céu. No caso dos gregos o Deus Cronos (tempo) engoliu alguns valores (filhos), mas a deus Prudência ou Métis e Zeus os devolveu à vida.
Falei-lhe de Prometeu, Epimeteu e Pandora, de Narciso, de Eco de deus vaidosos e superficiais que não percebiam o extremo grau de sua vaidade. Falei de Pandora e de Eva e da tentação de mexer nos segredos do infinito. Mostrei que também lia mitologia. Sabia das deusas, ninfas de musas, dos semideuses, dos gigantes e de como os gregos e latinos explicavam a vida, a dor, a alegria, a morte, as paixões com histórias e atribuições aos deuses.
Ouviu-me e perguntou como eu, sabendo tudo isso, ainda afirmava que Jesus é diferente. Respondi que poderia escolher o caminho da comparação como o sujeito que compara estradas e não viaja por nenhuma, compara computadores mas escreve a mão e compara veículos mas escolhi ir a pé. A fé supõe conhecimento, mas também supõe adesão. Mostrar cultura qualquer um pode. Informar-se sobretudo nos dias de hoje está ao alcance de qualquer um. Mas escolher e assumir é questão de atitude. O mundo tem muitos rios e estradas, mas se decidi aonde quero ir escolho os que me deixariam lá ou o mais perto possível de onde quero ir. Eu escolhi não ficar apenas nas comparações. Escolhi continuar crendo em Jesus, mesmo sabendo que antes dele houve histórias um pouco semelhantes às dele.
Conclui dizendo que sabia distinguir entre mito e realidade, entre símbolo e mistério e entre crença e fé.
Semanas depois veio falar comigo e quis saber mais sobre Cristologia. Indiquei cinco livros de católicos e dois de evangélicos que poderiam ajudá-la. Mas decidir, só ela poderia! Pelo que sei está lendo e comparando. Um dia desses ela decidirá se fica apenas no conhecimento ou se adere... Se aderir será por convicção dela. Não puxo ninguém para Jesus. Tenho sérias restrições ao marketing da fé. Deixo que a pessoa se informe e decida. O que decidir estará bom para mim. Não me tornei padre católico para encher os bancos dos nossos templos e arrastar milhões de almas para o Cristo e, sim, para revelar da melhor forma que conheço o rosto de Jesus Cristo. Tento seguir o jeito de Paulo:
Porque convosco falo e, enquanto for apóstolo dos gentios, exalto o meu ministério, para ver se de alguma maneira posso incitar à emulação os da minha carne e salvar alguns deles. (Rm 11, 13- 14)
Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns. (I Cor 9, 22)
Não quero que ninguém me siga. Mas se alguém quiser caminhar comigo iremos juntos. E não faço questão de ser madrinha de tropa ou de ir à frente segurando a seta. Descobri a importância das palavras outro e juntos. Para ser ouvido não preciso estar acima do meu povo. Às vezes um barco bastava para Jesus.
Posso até levar a Jesus, mas na maioria dos casos, sei que bastará apontar. Eles já o procuram há muito tempo. Até porque Jesus mandou duvidar dos que se dispõem a levar até ele agindo como quem sabe o caminho. (Mt 24,24-26) Pregador não é aeronave: é seta. E se for piloto terá que obedecer as rotas e os limites da aeronave!
padre zezinho

BENÇÃOS E MALDIÇÕES

Um percorrer de emissoras de rádio e uma leitura do Deuteronômio, capítulo 28,1-68 nos jogará no obscuro passado e no nebuloso presente da religião. Pelo menos nos de certas religiões, certas igrejas e certos pregadores. Usam da maldição de maneira terrorista e da bênção de maneira pragmática. Criam maldições e bênçãos a seu talante e interpretam como bênção ou maldição o que lhes convém. Amaldiçoam ou declaram malditos com enorme leviandade e criam bênção também com a mesma leviandade.
As coisas não são assim tão simples. Detecção e livramento de maldições é algo bem mais complicado do que parece. Dar a entender que Deus amaldiçoa até a quarta geração, isso depois de Jesus Cristo, ao menos para um cristão não deixa de ser estranho. Ou Paulo errou, ou andam lendo outros autores. Porque o apóstolo disse e as Igrejas cristãs em geral assinam em baixo de seu ensinamento:
Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição por nós; porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro; (Gl 3,13)
Porque, se o ministério da condenação foi glorioso, muito mais excederá em glória o ministério da justiça. (2 Cor 3, 9)
A justificação e o resgate veio com Cristo, depois de quem já não há condenação que não seja perdoada. Se a ofensa do velho Adão trouxe a punição o sacrifício do Novo Adão trouxe a graça para todos os homens.
Pois assim como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato de justiça veio a graça sobre todos os homens para justificação de vida. (Rm 5, 18) O sacerdócio de Jesus Cristo e seu martírio nos libertaram de qualquer maldição que pudesse haver em nós. Não precisa fazer isso de novo e de novo. Bastou uma vez para nos merecer a libertação. Não há pois necessidade de insistir na condenação e maldição antiga e sim na benção nova e no novo sacrifício.
Porque, assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo. (I Cor 15, 22)
Por isso convinha que em tudo fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo que é de Deus, para expiar os pecados do povo. (Heb 2, 17)
Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. (Heb 4, 15)Que não necessitasse, como os sumos sacerdotes, de oferecer cada dia sacrifícios, primeiramente por seus próprios pecados, e depois pelos do povo; porque isto fez ele, uma vez, oferecendo-se a si mesmo. (Heb 7, 27)
De outra maneira, necessário lhe fora padecer muitas vezes desde a fundação do mundo. Mas agora na consumação dos séculos uma vez se manifestou, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo. (Heb 9, 26)
Já fomos resgatados. Agora, já não se paga mais o resgate. Apenas se colhe os frutos dessa bênção. Quando pecamos e nos arrependemos já sabemos que não há mais maldição. Jesus morreu pelos pecados passados e pelos pecados futuros.
Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue. (At 20, 28)
Bem como o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a sua vida em resgate de muitos. (Mateus 20 : 28)
Isto posto, valem as admoestações de Tiago e de Paulo que seremos todos salvos e ressuscitados em Cristo. Já fomos lavados no seu sangue. Agora é dever de cada qual lavar-se nele sem medo porque a ameaça de vingança e de retaliação não existe mais.
Depois de Jesus falar em punição vingança, maldição pelos pecados de nossos antepassados e de nossos avós perdeu o sentido. Quebra de maldição lançada contra os antepassados não é mais necessário. Houve pecado, mas não maldição. Nem Jesus amaldiçoa nem nós devemos amaldiçoar. Agora é tempo de bênção e de redenção. Pedir a quem já foi lavado que se lave de novo porque seus pais nãos e lavaram é meio estranho.
Ou cremos no sangue salvador de Cristo e no batismo ou teremos que transformar nossos templos em piscinas nas quais todo o fiel que tiver alguma culpa deve mergulhar todos os dias antes de ir ao trabalho e outra vez se lavar quando voltar para casa. E se, pecar durante a noite deve correr ao templo e ao seu pastor para que o livre da maldição de mais aquele pecado. A conta da água nos templos irá á estratosfera.
Ou cremos no perdão ou viveremos tentando lavar as culpas de nossos pais e as nossas toda vez que errarmos. Ou cremos na misericórdia ou acentuaremos a punição inexorável. Nossa fé acabará medrosa e timorata.
De uma mesma boca procede a bênção e maldição. Meus irmãos, não convém que isto se faça assim. (Tg 3,: 10)
Porque o amor de Cristo nos toca para a frente porque, se um morreu por todos, logo todos morreram com ele. (2 Cor 5,14)
É questão de aceitar a expiação de Cristo de uma vez por todas e agora aceitar sua misericórdia de todo dia. O acento deve ser na bênção e não na maldição.
padre zezinho

Roma e o Cristianismo - primeiras perseguições

Melitão, bispo de Sardes, cidade da Ásia Menor, escreveu uma carta para o imperador Marco Aurélio defendendo os cristãos perseguidos. Nesta carta, ele fala da providencial coincidência entre o nascimento do Império e o aparecimento do cristianismo. Jesus nasceu quando Augusto era imperador, e pregou no reinado de Tibério. A rápida expansão do cristianismo se deveu principalmente à unificação da bacia mediterrânea sob o poderio romano e às facilidades proporcionadas pelas estradas e rotas marítimas, que permitiam a rápida circulação de pessoas e idéias.
Mas quando foi que o Império começou a se dar conta da existência do cristianismo?
O documento oficial mais antigo falando dos cristãos é do ano 112: uma carta enviada a Trajano pelo procônsul da Bitínia, Plínio, o Jovem.
A opinião pública confundia os judeus com os cristãos. Geralmente ambos os grupos eram vítimas das mesmas acusações e maledicências. Mas em Roma a diferença foi percebida bem cedo. Em 49, Cláudio "expulsa de Roma os judeus que se agitavam por instigação de Crestos [Cristo?]" (Suetônio).
Nero começou a governar com a idade de 17 anos. Dirigiu o Imperium de 54 a 68. Mandou matar o irmão, a mãe e seu mestre, Sêneca (os dois últimos sob influência da sua amante, Popéia Sabina). Em 62 divorciou-se da mulher, Otávia, a qual fez exilar em Pandatária. Tantos crimes provocaram a indignação popular.
Foi na noite de 18 (ou 19?) de julho de 64 que as trombetas dos sentinelas começaram a ser ouvidas pelos quatro cantos de Roma. O fogo se espalhava rapidamente. Depois de cento e cinqüenta horas, quatro dos catorze bairros da cidade tinham sido completamente devorados pelas chamas, enquanto de sete só sobravam as paredes das edificações ou escombros inabitáveis.
Sobre as causas da calamidade circularam vários rumores. Alguns pensaram que tinha sido apenas um acidente. Mas atribuir ao acaso tamanha destruição não parecia uma hipótese muito plausível. Precisava-se de um culpado. E logo o seu nome começou a correr de boca em boca.
Seria o próprio Nero o responsável? Sabia-se que ele desejava demolir as velhas construções para edificar uma nova Roma. Talvez fosse um castigo dos deuses por causa dos crimes hediondos do imperador. Suetônio nos fala de um boato segundo o qual Nero teria permanecido em uma torre durante o incêndio, com roupas de teatro e uma lira, admirando o terrível espetáculo e entoando um poema de sua autoria sobre a conquista de Tróia e o fogo nela ateado pelos guerreiros de Agamenon.
Nero logo teve de arrumar um bode expiatório. Através de torturas e falsas testemunhas, obteve as "provas" para acusar os cristãos. As prisões ficaram lotadas a ponto de Tácito se referir aos encarcerados como uma "grande multidão". Sob acusação de "inimigos do gênero humano", os cristãos foram perseguidos.
Tertuliano fala de um instrumento jurídico instituído por Nero para legalizar a perseguição, o Institutum Neronianum, que afirmava a ilicitude do cristianismo ("non licet esse Christianos", não é lícito ser cristão). Mas os historiadores não são unânimes em reconhecer isto como fato.
Não apenas os cristãos eram trucidados, degolados e crucificados no circo de Nero (que ficava localizado onde hoje está a Basílica de São Pedro). Organizaram-se verdadeiras caçadas nos jardins do imperador, com fiéis fantasiados de animais. Foram encenadas as mais escabrosas cenas, copiando a mitologia pagã, onde os "atores", cristãos, eram humilhados e ultrajados de mil maneiras e com sadismo indescritível. Durante a noite, pelas alamedas, cristãos cobertos de pez e resina ardiam em chamas, queimados vivos, iluminando o caminho para a passagem da carruagem de Nero.
Pedro, em uma de suas epístolas, alude a esses terríveis sofrimentos. Mais tarde, quando João escrever o Apocalipse, a sua lembrança ainda será muito viva.
Nada mudou com Domiciano (81-96), que se autoproclamou "Dominus et Deus". Quando o século I termina, a fé cristã já começa a conquistar as classes mais altas, chegando até o palácio do imperador. Flávio Clemente, Flávia Domitila, parentes de Domiciano, e Acílio Glábrio, um dos cônsules de 91, eram cristãos. Para satisfazer a alegria das elites pagãs, o imperador massacra os fiéis, tomando seus bens e executando-os sob a acusação de ateísmo. Na Ásia a perseguição foi bem violenta.
Trajano (98-117), mais tolerante, responde a Plínio, o Jovem, em uma carta dizendo que os cristãos não deviam ser procurados e que as denúncias anônimas deviam ser ignoradas. Os cristãos convictos que se recusassem a abandonar suas crenças, no entanto, seriam punidos. O Rescrito de Trajano, como é conhecido este documento, estabeleceu jurisprudência

CANTOR EVANGÉLICO É PRESO POR MASTURBAÇÃO EM ÔNIBUS

Paulo Gontijo de 45 anos foi pela Polícia Militar de Ouro Preto do Oeste (GO) por estar se masturbando dentro de um ônibus interestadual. Paulo é cantor evangélico há 17 anos, com 5 cds gravados e atualmente congrega na Igreja Assembléia de Deus Madureira, na cidade de Goiânia.
De acordo com informação da Polícia Militar o acusado estava vindo de uma turnê no Estado, embarcando no município de Cacoal na manhã do último domingo(18) com destino a Ouro Preto do Oeste onde iria fazer uma apresentação a noite em uma Igreja evangélica no município de Urupá.
Segundo uma mulher, o cantor sentou ao seu lado e no inicio da viagem pareceu uma pessoa confiável, mas próximo ao município de Ouro Preto do Oeste, ele abriu o zíper da calça e passou a se masturbar na maior cara de pau, fato este que deixou a mulher constrangida.
Ainda dentro do veículo, a mulher ligou no 190 e disse o que estava ocorrendo. Foi quando então uma viatura policial se deslocou até a Rodoviária e quando o acusado desembarcou foi dado voz de prisão ao mesmo que foi conduzido a DP local.
Paulo Gontijo confirmou que estava se masturbando, mas que colocou um paletó durante o ato para ninguém presenciar o seu “sexo solitário”.
O cantor demonstrou arrependimento e creditou o ato às forças do mal, acrescentando que está a vinte dias longe da esposa e das duas filhas.
Paulo assinou um Termo Circunstanciado e vai responder o processo judicial com base no Art. 233 do Código Penal Brasileiro que diz praticar ato obsceno em público é crime punível com pena de três meses a um ano de prisão ou multa.

O que deveríamos saber sobre Galileu

O caso de Galileu costuma ser utilizado para afirmar que a Igreja Católica é inimiga do progresso científico. Portanto, chama a atenção que bastantes católicos, incluídos sacerdotes, religiosos e outras pessoas que têm conhecimentos teológicos, conheçam esse caso de modo bastante superficial e em ocasiões, até equivocado.
1.
Como morreu Galileu?
2.
Por que foi condenado?
3.
Dúvidas e interpretações
1. Como morreu Galileu?
O primeiro ponto que deveria ficar claro é que a Inquisição não matou a Galileu, nem a ninguém. Morreu de morte natural. Galileu nasceu na terça-feira, 15 de fevereiro de 1564 em Pisa, e morreu na quarta-feira, 8 de janeiro de 1642, em sua casa, uma vila em Arcetri nas imediações de Florença. Portanto quando morreu tinha quase 78 anos (é possível encotrar uma diferença de ano inclusive em documentos oficiais, porque então, em Florença, os anos começavam a com contar em 25 de março, data da Encarnação do Senhor). Conta Vicenzo Viviani, um jovem discípulo de Galileu que permaneceu continuamente junto a ele nos últimos trinta meses, que sua saúde estava muito esgotada: tinha uma grave artrite desde os 30 anos e a isto se unia - uma irritação constante e quase insuportável nas palpebras - e outros achaques que traz consigo uma idade tão avançada, sobretudo quando se tem consumido no muito estudo e vigilia -.
Acrescenta que, apesar de tudo, seguia cheio de projetos de trabalho, até que por fim, lhe assaltou uma febre que o foi consumindo lentamente e uma forte palapitação, com a que ao longo de dois meses foi se extenuando cada vez mais, e por fim, uma quarta-feira, que era o dia 8 de janeiro de 1642, às quatro horas da manhã, morreu com firmeza filosófica e cristã, aos setenta e sete anos de idade, dez meses e vinte dias. Portanto, não existiu a fogueira nem nada parecido.
Tampouco foi condenado à morte. O único processo em que foi condenado ocorreu em 1633, e ali foi condenado à prisão que em vista de suas boas disposições, foi comutada imediatamente por prisão domiciliar, de modo que nunca chegou a ingressar em um cárcere. Segundo as normas comuns, durante o processo deveria ter estado na prisão da Inquisição, mas de fato não esteve nunca lá: antes de começar o processo se alojou na embaixada de Toscana em Roma, situada no Palazzo Firenze, onde vivia o embaixador; durante o processo foi exigido em alguns momentos que se alojasse no edifício da Inquisição, mas então lhe habilitaram umas estâncias que estavam reservada para os eclesiásticos que trabalhavam ali, permitindo que lhe levassem comida da embaixada Toscana; e ao acabar o processo foi permitido que estivesse alojado na Vila Médici, uma das melhores vilas de Roma, com esplêndidos jardins, que era propiedade do Grande Duque de Toscana. Tudo isto se explica porque Galileu era oficialmente o primeiro matemático e filósofo do Grande Duque de Toscana, território importante (inclui Florença, Pisa, Livorno, Siena, etc.) e tradicionalmente bem relacionado com a Santa Sede, e as autoridades de Toscana exerceram bons ofícios para que em Roma Galileu fosse tratado o melhor possível, como de fato sucedeu. O embaixador de Toscana, Francesco Niccolini, apreciava muitíssimo a Galileu, e colocou todos os meios para que sofresse menos possível com o processo, e para que não fosse preso. Niccolini conseguiu que, ao acabar o processo, a pena de prisão que se impôs fosse comutada por confinamento na Vila Médici. Depois de poucos dias foi permitido que se trasladasse a Siena, onde se alojou no palácio do arcebispo, monsenhor Ascanio Piccolomini; este era um grande admirador e amigo de Galileu, e o tratou esplendidamente durante os vários meses em que esteve em sua casa, de modo que ali recuperou-se do trauma que sem dúvida, supôs para o processo (em 1633, quando ocorreu o processo. Galileu tinha 69 anos). Depois, foi permitido que se trasladasse à casa que tinha fora de Florença, e ali permaneceu até que morresse, já velho, de morte natural. Acabou sua obra mais importante, e a publicou, em 1638, depois do processo.
Definitivamente, Galileu não foi condenado à morte, mas a uma prisão que não chegou a se executar porque foi comutada: primeiro, por uma estância de vários dias na Vila Médici, em Roma; depois, por uma estância de vários meses no palácio de seu amigo arcebispo de Siena; e a continuação (fins de 1633), foi-lhe permitido residir, em uma espécie de prisão domiciliar, em sua própria casa, na Vila do Gioiello, em Arcetri, nas imediações de Florença, onde viveu e trabalhou até sua morte.
Galileu nunca foi submetido a tortura ou a maus tratos físicos. Sem dúvida, faze-lo ir a Roma vindo de Florença para ser julgado, tendo 69 anos, supõe mau trato, e o mesmo se pode dizer da tensão psicológica que teve que suportar durante o processo e na condenação final, seguida de uma abjuração forçada. É certo. Desde o ponto de vista psicológico, com a repercussão que isto pode ter na saúde, Galileu teve que sofrer por estes motivos e, de fato, quando chegou a Siena depois do processo, se encontrava em más condições. Mas é igualmente certo que não foi nenhum objeto dos maus tratos físicos típicos da época. Algum autor afirmou que, durante o processo, ao final, em uma ocasião, foi submetido a tortura; entretanto, autores de todas as tendências estão de acordo, com praticamente unanimidade, que isto realmente não aconteceu. Na fase conclusiva do processo, em uma ocasião, encontra-se uma ameaça de tortura por parte do tribunal, mas todos os dados disponíveis estão a favor de que se tratou de uma pura formalidade que, devido aos regulamentos da Inquisição, o tribunal devia mencionar, mas sem intenção de levar à prática da tortura e sem que, de fato, se realizasse (consta, além disso, que em Roma não se praticava a tortura com pessoas da idade de Galileu). Depois da condenação, em Siena, Galileu se recuperou. Logo sofreu diversas doenças, mas eram as mesma que já sofria habitualmente desde muitos anos antes, que foram se agravando com a idade. Chegou a ficar completamente cego, mas nada teve a ver com o processo.
2. Porque Galileu foi condenado?
O que mais chama a atenção não são os maus tratos físicos que como acabamos de ver, não existiram, mas o fato em si mesmo de que Galileu foi condenado, com as tensões e sofrimentos que isto implica. Desde logo, não era homicida, nem ladrão, nem malfeitor em nenhum sentido habitual da palavra. Então, porque foi condenado? Qual foi a condenação?
Costuma-se falar de dois processos contra Galileu: o primeiro em 1616, e o segundo em 1633. Às vezes só se fala do segundo. O motivo é simples: o primeiro processo realmente existiu, porque Galileu foi denunciado à Inquisição romana e o processo foi adiante, mas Galileu não chegou a ser convocado diante do tribunal: o denunciado se inteirou de que existia a denúncia e o processo através de comentários de outras pessoas, mas o tribunal nunca lhe disse nada, nem o convocou, nem o condenou. Por isso com freqüência não se considera que tratou-se de um autêntico processo, ainda que de fato a causa se abriu e se desenvolveram algumas diligências processuais durante meses. Ao contrário, o de 1633 foi um processo a toda regra: Galileu foi intimado a comparecer diante do tribunal da Inquisição de Roma, teve que se apresentar e declarar diante desse tribunal, e finalmente foi condenado. Tratam-se de dois processos muito diferentes, separados por muitos anos; mas estão relacionados, porque o que aconteceu no de 1616 condicionou em grande parte o que aconteceu em 1633.
2.1. O processo de 1616
Em 1616 Galileu era acusado de postular o sistema heliocêntrico proposto na antigüidade pelos pitagóricos e na época moderna por Copérnico: afirmava que a Terra não está quieta no centro do mundo, como geralmente se acreditava, mas que gira sobre si mesma e ao redor do Sol, da mesma forma que os outros planetas do Sistema Solar. Isto parecia ir contra textos da Bíblia onde se diz que a Terra está quieta e o Sol se move, de acordo com a experiência; além disso, a Tradição da Igreja assim havia interpretado a Bíblia durante séculos, e o Concílio de Trento havia insistido em que os católicos não deveriam admitir interpretações da Bíblia que se afastassem das interpretações unânimes dos Santos Padres.
Os acontecimentos de 1616 acabaram com dois atos extra-judiciais. Por um lado, publicou-se um decreto da Congregação do Index, datado de 5 de março de 1616, pelo qual se incluiram no índice de livros proibidos três livros: Sobre as revoluçôes do cônego polaco Nicolau Copérnico, publicado em 1543, onde se expunha a teoria heliocêntrica de modo científico; um comentário do agustino espanhol Diego de Zúñiga, publicado em Toledo em 1584 e em Roma em 1591, onde se interpretava alguma passagem da Bíblia de acordo com o copernicanismo; e um opúsculo do carmelita italiano Paolo Foscarini, publicado em 1615, onde defendia-se que o sistema de Copérnico não está contra a Sagrada Escritura. Ficava afetado pelas mesmas censuras qualqurer outro livro que ensinasse as mesmas doutrinas. O motivo que se dava no decreto para essas censuras era de que a doutrina que defende que a Terra se move e o Sol está em repouso é falsa e completamente contrária à Sagrada Escritura. Por outro lado, Galileu foi admoestado pessoalmente para que abandonasse a teoria heliocêntrica e se abstivesse de defendê-la.
O opúsculo de Foscarini foi proibido absolutamente. Ao contrário, os livros de Copérnico e de Zúñiga somente foram suspendidos até que se corrigissem algumas passagens. No caso de Zúñiga, o que deveria se modificar era muito breve. No caso de Copérnico tratavam-se de diversas passagens onde deveria explicar que o heliocentrismo não era uma teoria verdadeira, mas só um artifício útil para os cálculos astronômicos. De fato, essas correções foram preparadas e aprovadas ao fim de quatro anos, em 1620.
Podemos nos perguntar por que se dava tanta importância a algo que, hoje em dia, parece simples: quando a Bíblia fala de questões científicas, com freqüência adota o modo de falar próprio da cultura, da época ou simplesmente da experiência ordinária. De fato este foi um dos argumentos que Galileu utilizou em sua Carta a Benedetto Castelli, que circulou em cópias à mão (Castelli era um beneditino, amigo e discípulo de Galileu, professor de matemática na Universidade de Pisa), e com maior extensão em sua Carta à Grande Duquesa de Toscana, Cristina de Lorena (mãe do que naqueles momentos era Grande Duque de Toscana, Cosme II), a quem havia chegado ecos das acusações bíblicas contra Galileu.
Para compreender o fundo do assunto deve-se mencionar três problemas. Em primeiro lugar, Galileu tinha se tornado célebre com seus descobrimentos astronômicos de 1609-1610. Utilizando o telescópio que ele mesmo contribuiu de modo decisivo para aperfeiçoar, descobriu que a Lua possui irregularidades como a Terra, que ao redor de Júpiter giram quatro satélites, que Vênus apresenta fases como a Lua, que na superfície do Sol existem manchas que mudam de lugar, e que existem muito mais estrelas do que as que se vêem a olho nu. Galileu se baseou nestes descobrimentos para criticar a física aristotélica e apoiar o heliocentrismo copernicano. Os professores aristotélicos, que eram muitos e poderosos, sentiam que os argumentos de Galileu contradiziam sua ciência, e às vezes passavam ridículo. Estes professores atacaram seriamente a Galileu e, quando acabavam-se as respostas, alguns recorreram aos argumentos teológicos (a pretendida contradição entre Copérnico e a Bíblia).
Em segundo lugar, a Igreja católica era naqueles momentos especialmente sensível para com aqueles que interpretavam por sua conta a Bíblia, afastando-se da Tradição, porque o enfrentamento com o protestantismo era muito forte. Galileo se defendeu de quem dizia que o heliocentrismo era contrário à Bíblia explicando por que não era, mas com isto se fazia de teólogo, o que era considerado então como algo perigoso, sobretudo quando, como neste caso, se afastava das interpretações tradicionais. Galileu argumentou bem como teólogo, sublinhando que a Bíblia não pretende nos ensinar ciëncia e se acomoda aos connhecimentos de cada momento, e inclusive mostrou que na Tradição da Igreja se encontravam precedentes que permitiam utilizar argumentos como os que ele propunha. Mas, em uma época de fortes polêmicas teológicas entre católicos e protestantes, estava muito mal visto que um profano pretendesse dar lições aos teólogos, propondo algumas novidades um tanto estranhas.
Em terceiro lugar, a cosmovisão tradicional, que colocava a Terra no centro do mundo, parecia estar de acordo com a experiência ordinária: vemos que se movem o Sol, a Lua, os planetas e as estrelas; ao invés, se a Terra se movesse, deveriam suceder coisas que não sucedem: projétéis atirados para cima cairiam atrás, não se sabe como estariam as nuvens unidas à Terra sem ficar também atrás, se deveria notar um movimento tão rápido.
Além disso, essa cosmovisão tradicional parecia muito mais coerente com a perspectiva cristã de um mundo criado para o homem, e também com a Encarnação e a Redenção da humanidade através de Jesus; de fato, entre aqueles que haviam aceitado as idéias de Copérnico contava-se Giordano Bruno, que defendeu que existem muitos mundos habitados e acabou sustentando doutrinas mais ou menos heréticas (Bruno foi queimado, como conseqüência de sua condenação pela Inquisição romana, em 1600, ainda que deve-se sublinhar, não como desculpa mas para maior claridade, que não era propriamente um cientista, ainda que utilizasse o copernicanismo como ponto de partida).
Os acontecimentos de 1616 culminaram em um decreto da Congregação do Índex, datado de 5 de março de 1616, pelo qual foram proibidos os livros mencionados, com os matizes já apontados. O decreto foi publicado em nome da Congregação, e está assinado pelo cardeal prefeito e pelo secretário da Congregação, não pelo Papa. Desde então, um ato desse tipo era feito com o mandato ou aprovação do Papa e, de algum modo, comprometia a autoridade do Papa, mas de nenhuma maneira pode ser considerado como un ato que se põe em jogo a infalibilidade do Papa: por uma parte, porque nem está assinado pelo Papa e nem mesmo a menciona; por outra, porque trata-se de um ato de governo de uma Congregação, não de um ato de magistério; e além disso, porque não pretende definir uma doutrina de modo definitivo. Isso era perfeitmente sabido então, como agora; como prova disso pode-se mencionar uma carta de Benedetto Castelli a Galileu, escrita em 2 de outubro de 1632, quando já tinha sido ordenado a Galileu que comparecesse perante a Inquisição de Roma. Castelli falou com o Padre Comissário do Santo Ofício, Vincenzo Maculano, e defendeu a ortodoxia da posição de Copérnico e de Galileu, acrescentando que várias vezes falou de tudo isso com teólogos piedosos e muito inteligentes, e não viram nenhuma dificuldade; acrescenta que o próprio Maculano lhe disse que concordava e que, em sua opinão, a questão não deveria se resolver recorrendo à Sagrada Escritura. É fácil advertir que estas opiniões, tratadas no próprio Comissário do Santo Ofício, não teriam sentido se o decreto do índex de 1616 pudesse ser interpretado como tendo um alcance de magistério infalível ou definitivo.
Nas deliberações da Santa Sede, prévias ao decreto, foram pedidas as opiniões de onze consultores do Santo Ofício, que relataram, em 24 de fevereiro de 1616, que dizer que o Sol está parado no centro do universo é absurdo em filosofia e além disso formalmente herético, porque contradiz muitos lugares da Escritura tal como expõe os Santos Padres e os teólogos, e dizer que a Terra se move é também um absurdo em filosofia e ao menos errôneo na fé. Com freqüência é tomada esta opinião dos teólogos consultores como se fosse ditame da autoridade da Igreja, mas não é: foi somente a opinião dessas pessoas. O único ato público da autoridade da Igreja foi o decreto da Congregação do Índex, e nesse decreto não é dito que a doutrina heliocêntrica seja herética: é dito que é falsa e que se opõe à Sagrada Escritura. O matiz é importante, e qualquer entendido em teologia o sabia então e o sabe agora. Ninguém considerou, então, nem deveria considerar agora, que o heliocentrismo foi condenado como heresia, porque não é certo. Isto explica que Galileu e outras pessoas igualmente católicas continuaram aceitando o heliocentrismo; Galileu sabia (e estava certo) que ele havia mostrado, em suas cartas a Castelli e a Cristina Lorena, que o heliocentrismo podia ser compatível com a Sagrada Escritura, utilizando além disso princípios que não eram novos, mas que tinham apoio na tradição da Igreja.
A decisão da autoridade da Igreja em 1616 foi equivocada, ainda que não tenha qualificado o heliocentrismo como heresia. Galileu e seus amigos eclesiáticos se propuseram a conseguir que este decreto fosse revogado. Poderiam ter conseguido: trata-se de um decreto disciplinar que ainda que fosse acompanhado por um valor doutrinal, não condenava o heliocentrismo como heresia, nem era um ato de magistério infalível.
Outro aspecto importante a levar em conta é que, ainda que as críticas de Galileu à posição tradicional estavam fundamentadas, nem ele nem ninguém possuiam naqueles momentos argumentos para demonstrar que a Terra se move ao redor do Sol. Esta afirmação parecia, mais absurda, tal como a qualificação dos teólogos do Santo Ofício. Em uma famosa carta, o cardeal Roberto Belarmino, um dos teólogos mais influentes então, pedia tanto a Foscarini como a Galileu que utilizassem o heliocentrismo somente como um hipótese astronômica, sem pretender que fosse verdadeira nem entrar em argumentos teológicos, em cujo caso não haveria nenhum problema. Mas Galileu para defender-se de acusações pessoais e para tentar que a Igreja não interviesse no assunto, se lançou a uma defesa forte do copernicanismo, mudando-se para Roma e tentando influenciar nas personalidades eclesiásticas; isto teve talvez um efeito contrário, provocando que a autoridade da Igreja interviesse para frear a propaganda de Galileu que, ao menos em suas críticas, era bastante convincente.
Além do decreto da Congregação do Índex, as autoridades eclesiásticas tomaram outra decisão que afetava pessoalmente a Galileu e que influiu decisivamente em seu processo, 17 anos mais tarde. Em concreto, por ordem do Papa (Paulo V), o cardeal Belarmino citou Galileu (que encontrava-se então em Roma, dedicado à propaganda do copernicanismo) e, na residência do cardeal, em 26 de fevereiro de 1616, o admoestou a abandornar a teoria copernicana. O Papa tinha mandado Belarmino a que fizesse essa admoestação, acrescentando que, se Galileu não quisesse abandonar a teoria, o Comissário do Santo Ofício, diante do notário e testemunhas, o ordenasse para que não ensinasse, defendesse nem tratasse essa doutrina, e que se isto fosse negado, que o prendesse. Consta que Belarmino fez a admoestação. Mas entre os documentos que foram conservados existe um que deu espaço a discussões sobre a força e o alcance desse preceito: disse que, em continuação à admoestação de Belarmino, o Padre Comissário do Santo Ofício (o dominicano Michelangelo Seghizzi) transmitiu o preceito mencionado; mas esse documento está sem assinar. Foram dadas interpretações de todo tipo; a mais extrema é que tratasse de um documento falsificado deliberdamente en 1616 ou em 1633 para acabar com Galileu; mas isto parece muito pouco provável. Com os documentos que possuímos, é muito dificil saber exatamente como se desenvolveu o encontro com Belarmino e Galileu, mas está claro que Galileu entendeu perfeitamente, que em diante, não poderia argumentar a favor do copernicanismo, e com efeito assim o fez durante anos. Precisamente o processo a que foi submetido 17 anos depois, em 1633, foi motivado porque, aparentemente, Galileu desobedeceu a esse preceito.
2.2. O processo de 1633
Se o decreto da Congregação do Índex em 1616 foi um equívoco, também o foi proibir Galileu de tratar ou defender o copernicanismo. Galileu o sabia. Entretanto, obedeceu. Sempre foi e quis ser um bom católico. Mas sabia que a proibição de 1616 era baseada em um equívoco e queria solucioná-lo. Inclusive advertia do perigo de escândalo que poderia ocasionar essa proibição no futuro, se chegasse a demonstrar com certeza que a Terra gira ao redor do Sol. Seus amigos concordavam com ele.
Em 1623 coincidiram umas circunstâncias que pareciam favorecer uma revisão das decisões de 1616, ou pelo menos tornar possível que se expusesse ainda que fosse com cuidado, os argumentos a favor do copernicanismo. O fator principal foi a eleição como Papa do cardeal Maffeo Barberini, que adotou o nome de Urbano VIII. Era, há muitos anos, um admirador de Galileu, a quem inclusive havia dedicado uma poesia latina em que louvava seus descobrimentos astronômicos. Além disso, desde o primeiro momento teve em postos muita confiança em vários amigos e partidários de Galileu. Em 1624 Galileu foi a Roma e o Papa o recebeu seis vezes, com grande cordialidade. Mas Galileu comprovou ao sondar sobre o assunto do copernicanismo, que se bem Urbano VIII não o considerava herético (já vimos que nunca foi declarado como tal), o considerava como uma posição doutrinalmente temerária e além disso, estava convencido de que nunca poderia se demonstrar: dizia que os mesmos efeitos observáveis que se explicam com essa teoria, poderiam ser devidos à outras causas diferentes, pois caso contrário, estaríamos limitando a onipotência de Deus. Tratava-se de um argumento que, aparentemente, tinha muita força, e parecia que quem pretendesse demonstrar que o copernicanismo estava pondo limites à onipotência de Deus.
Apesar de tudo, o humor do novo Papa e a posição estratégica de seus amigos levaram a Galileu a embarcar em um velho projeto pendente: escrever uma grande obra discutindo o copernicanismo e, desde então, argumentando a seu favor. Simplesmente, a apresentaria como um diálogo entre um partidário do geocentrismo e outro do heliocentrismo, sem deixar resolvida a questão. E acrescentaria o argumento do Papa. Mas o leitor inteligente logo se daria conta de que ele tinha razão.
Além disso, Galileu pensava que dispunha de um argumento novo que demonstrava o movimento da Terra: o argumento das marés. Segundo Galileu, as marés só poderiam ser explicadas supondo o movimento da Terra (e não aceita, como se soasse a astrologia, que se devesse à influência da Lua). Inclusive queria entitular sua obra desse modo, como um tratado sobre as marés, mas o Papa soube que pretendia utilizar este título e, como soava demasiadamente realista (como de fato era), aconselhou colocar outro título que não parecesse uma prova do movimento da Terra (desde então, como sabemos, o argumento das marés estava errado). Galileu mudou o título do livro, que passou a chamar Diálogo em torno dos grandes sistemas do mundo, o tolemaico e o copernicanno. Um título muito acertado devido, em parte, à interferência de um Papa que não queria que se tratasse o movimento da Terra como algo real: mas sem dúvida, essa era a intenção principal de Galileu em sua obra. Galileu estava disposto a conceder tudo o que fosse necessário, com tal de publicar uma obra onde se recorressem os argumentos contra a posição tradicional e a favor do copernicanismo.
Galileu acabou de redatar o Diálogo em 1630, e o levou a Roma para obter a permissão eclesiástica para imprimi-lo. A permissão deveria ser concedida pelo Mestre do Sagrado Palácio, o dominicano Niccolò Riccardi, que não sabia astronomia mas era admirador de Galileu e sempre tinha se mostrado desejoso de ajudá-lo. Agora Riccardi se encontrou em um compromisso. Deu a entender que não haveria problemas, ainda que devesse ajustar uma série de detalhes. Galileu voltou a Florença, a peste causou sérias limitações ao tráfego e correio entre Florença e Roma, e aí começou uma cadeia de quívocos que alargaram a concessão da permissão e deixou Galileu irritado. Ao fim de um ano, Galileu solicitou e obteve a intervenção do Grande Duque de Toscana e de seu embaixador em Roma para obter a permissão. Riccardi, que também era toscano e era parente da esposa do embaixador, foi submetido a uma pressão muito forte. Finalmente concedeu a permissão para que se imprimisse o livro em Florença, mas com uma série de condições que se fazia saber Galileu e o Inquisidor de Florença,. Riccardi sabia o que o Papa pensava: que só se poderia tratar o copernicanismo como uma hipótese matemática, não como uma representação da realidade; as condições e advertências que deu se encaminhavam a garantir, que não estava nada claro na obra de Galileu.
Galileu introduziu a mudança, mas, seguramente, nem todas as que tinha introduzido Riccardi e tivesse desejado o Papa. No livro, Simplício, o personagem que defende a posição tradicional de Aristóteles e Ptolomeu, sempre sai perdendo. Simplício foi um dos mais famosos comentadores antigos de Aristóteles, mas na obra de Galileu dava a impressão de que seus argumentos e sua atitude correspondiam muito bem a seu nome. Por outro lado, o argumento favorito do Papa aparecia no final da obra: depois de ter exposto todos os argumentos físicos e filosóficos, Simplício, precisamente Simplício, utilizava esse argumento, e ainda que Salviati, o defensor de Copérnico (e Galileu) o aprovasse, o final é muito breve e forçado. Para maior confusão, uma introdução aprovada por Riccardi, em que se explicava que essa obra não pretendia estabelecer o copernicanismo como teoria verdadeira, apareceu impressa em um tipo diferente do resto da obra, dando a impressão de uma adição postiça.
O diálogo terminou de ser impresso em Florença em 21 de fevereiro de 1632. Galileu enviou em seguida exemplares por todas as partes, também a seus amigos em outros países da Europa. Ainda havia problemas de comunicação com Roma por causa da peste, de modo que os primeiros exemplares não chagaram a Roma até a metade de maio. Um deles foi entregado ao cardeal Francesco Barberini, sobrinho e mão direita do Papa, a quem Galileu havia ajudado há alguns anos, a conseguir o doutorado, e quem considerava, igualmente ao Papa, como um grande amigo pessoal.
Em 1632, a maior preocupação do Papa era precisamente o movimento do Sol e da Terra. Estava em pleno desenrolar a Guerra dos Trinta Anos, que começou em 1618 e não terminou até 1648, que enfrentava toda a Europa em duas metades, os católicos e os protestantes. Naquele momento havia problemas muito complexos, porque a França católica se encontrava mais para o lado dos protestantes da Suécia e Alemanha, enfrentada com outras potências católicas, Espanha e o Império. Urbano VIII tinha sido cardeal legado em Paris e tendia a alinhar-se com os franceses, temendo, além disso, uma excessiva prepotência dos espanhóis, e tentando não perder a França.Tratava-se de equilíbrios muito difíceis. Os problemas eram graves. Em 8 de março de 1632, em uma reunião de cardeais com o Papa, o cardeal Gaspar Borgia, protetor da Espanha e embaixador do Rei Católico, acusou abertamente ao Papa de não defender como era preciso a causa Católica. Criou-se uma situação extraordinariamente violenta. Nessas condições, Urbano III via-se especialmente obrigado a evitar qualquer coisa que pudesse ser interpretada como não defender a fé católica de modo suficientemente claro.
Precisamente nestas circunstâncias, a metade de maio, começaram a chegar em Roma os primeiros exemplares do Diálogo. Em um primeiro momento não aconteceu nada. Mas em dois meses, à metade de julho, se soube que o Papa estava muito enfadado com o livro, que tentava frear sua difusão, e que iria criar uma comissão para estudá-lo e julgá-lo.
A documentação que possuímos não permite saber o que provocou o enfado e a decisão do Papa. Galileu sempre atribuiu a isto a atuação de seus inimigos (que não eram poucos nem pouco influentes), que teriam informado ao Papa de modo tendencioso, predispondo-o contra. Por exemplo, além de denunciar que o livro defendia o copernicanismo, sendo contra o decreto de 1616, teriam colocado em relevo que um dos três personagens que intervinham no diálogo, Simplício, que sempre costumava perder, é quem expõe o argumento preferido do Papa sobre a onipotência de Deus e os limites de nossas explicações. Isto poderia parecer uma provocação deliberada, e parece que foi assim interpretado: vários anos depois, Galileu ainda enviava uma mensagem ao Papa, da sua vila de Arcetri, fazendo-se saber que jamais havia passado por sua mente tal coisa. Além disso, como foi assinalado, as circunstâncias pessoais de Urbano VIII naquele momento eram difíceis, e não podia tolerar que se publicasse um livro, que aparecida com a permissão eclesiástica de Roma e de Florença, em que se defendia uma teoria condenada pela Congregação do Índex em 1616 como falsa e contrária a Sagrada Escritura.
O Papa estabeleceu uma comissão para examinar as acusações contra Galileu e julgou que o assunto devia ser enviado ao Santo Ofício (ou Inquisição romana), de onde foi ordenado a Galileu, que vivia em Florença, que se apresentasse em Roma ante esse tribunal durante o mês de outubro de 1632. Depois de tentativas de prorrogação que duraram vários meses, em 30 de dezembro de 1632, o Papa com a Inquisição deu a conhecer que, se Galileu não se apresentasse em Roma, enviaria alguém que se certificasse de sua saúde e se visse que poderia ir a Roma, o levaria preso. O Papa aconselhou seriamente ao Grande Duque que se abstivesse de intervir, porque o assunto era sério. As autoridades toscanas decidiram aconselhar a Galileu que fosse a Roma. O Embaixador Noccolini, que conhecia bem ao Papa e falava com ele com freqüência, advertia que discutir com o Papa e contrariá-lo era o melhor caminho para arruinar a Galileu. Quando o Papa falava com Niccolini do problema causado por Galileu, em várias ocasiões encheu-se de cólera. Todos advertiram Galileu que o melhor era que fosse a Roma e que se mostrasse em todo o momento disposto a obedecer no que dissessem, porque se tomasse outra atitude as conseqüências seriam prejudiciais para ele.
Galileu chegou a Roma no domingo dia 13 de fevereiro de 1633, em um liteira facilitada pelo Grande Duque, depois de esperar na fronteira dos Estados Pontifícios por causa da peste que seguia em Florença. O embaixador de Toscana, Francesco Niccolini, se portou maravilhosamente com Galileu, intervindo continuamente em seu favor ante as autoridades de Roma, de acordo com as instruções do Grande Duque, Conseguiram que Galileu não estivesse na cárcere do Santo Ofício, como exigia a norma. Desde sua chegada à Roma até 12 de abril (dois meses), Galileu viveu no Palácio de Florença, onde se encontrava a embaixada de Toscana e a casa do embaixador. As autoridades o recomendaram que evitasse a vida social, de modo que não saía de casa, mas gozava de um tratamento excepcional por parte do embaixador e de sua esposa. Niccolini pedia ao Papa que o assunto fosse o mais breve possível, mas se alongava porque a Inquisição ainda estava deliberando sobre o modo de atuar. Como se descobriu nos arquivos do Santo Ofício o escrito de 1616 em que proibia Galileu de tratar de qualquer modo o copernicanismo, o processo se centrou completamente em uma única acusação: a desobediência desse preceito em 1616.
Galileu foi chamado a depor no Santo Ofício na terça-feira 12 de abril de 1633. Sua defesa pode nos parecer muito estranha: negou que, no Diálogo, defendesse o copernicanismo. Galileu sabia que o Santo Ofício pediu a opinião de três teólogos a respeito e que, em 17 de abril, os três informes concluiam sem lugar a dúvidas (como de fato assim o era) que Galileu, em seu livro, defendia o copernicanismo; neste caso, os teólogos tinham razão. Isto complicava a situação, pois um acusado que não reconhecia um erro comprovado devia ser tratado muito severamente pelo tribunal. Por outro lado, Galileu se defendeu mostrando uma carta que, a seu pedido, o cardeal Balarmino tinha escrito depois dos acontecimentos de 1616, para que pudesse se defender frente àqueles que o caluniavam; nesse escrito, Belarmino dava fé de que Galileu não teve que abjurar de nada e que simplesmente tinha sido notificada a proibição da Congregação do Índex. Mas isso podia ser interpretado também contra Galileu se fosse mostrado, como era o caso, que em seu livro argumentava a favor da doutrina condenada em 1616. O tribunal centrou-se em matizes da proibição feita a Galileu em 1616, que Galilleu dizia não se lembrar, porque tinha conservado o documento de Balarmino e aí não se incluiam esses matizes. Desafortunadamente, Balarmino havia morrido e não podia esclarecer a situação.
Estes dias Galileu seguia no Santo Ofício, ainda que tampouco tivesse estado na prisão. Por deferência com o Grande Duque de Toscana e frente a insistência o embaixador, Galileu foi instalado nas habitações do fiscal da Inquisição, traziam-lhe comidas da embaixada de Toscana, e podia passear. Esteve ali desde a terça-feira 12 de abril até o sábado 30 de abril: 17 dias completos.Para desbloquear a situação, o Padre Comissário propôs aos Cardeais do Santo Ofício algo insólito: visitar Galileu em suas estalagens e tentar convencê-lo a reconhecer seu erro. Conseguiu depois de uma longa conversa com Galileu em 27 de abril. No dia seguinte, sem comunicar a ninguém mais, escreveu o que tinha feito e o resultado ao cardeal sobrinho do Papa, que encontrava-se nestes dias em Castelgandolfo com o Papa; através dessa carta se vê claramente que esta atuação estava aprovada pelo Papa: desse modo, o tribunal poderia salvar sua honra condenando a Galileu, e logo poderia usar clemência com Galileu deixando-o recluso em sua casa, tal como ( disse o Padre Comissário) sugeriu Vossa Excelência (o cardeal Francesco Barberini).
Com efeito, no sábado 30 de abril Galileu reconheceu perante o tribunal que, ao voltar a ler agora seu livro, que tinha acabado há muito tempo, se dava conta de que, devido a não má fé, mas a vanglória e ao desejo de se mostrar mais engenhoso que o resto dos mortais, tinha exposto os argumentos a favor do copernicanismo com uma força que ele mesmo não acreditava que tivesse. A partir daí, as coisas se desenrolaram como o Comissário tinha previsto. Esse mesmo dia foi permitido a Galileu voltar ao Palácio de Florença, à casa do embaixador. Na terça-feira 10 de maio foi chamado ao Santo Ofício para que apresentasse sua defesa; apresentou o original da carta do cardeal Belarmino, e reiterou que tinha atuado com reta intenção. Continuava fechado no palazzo Firenze; o embaixador conseguiu que lhe permitisse a passear na Vila Médici, e inclusive em Castelgangolfo, porque lhe causava mal não fazer nenhum tipo de exercício. Entretanto, a peste continuava açoitando Florença, em alguma carta o diziam que, no meio de sua desgraça, era uma sorte que não estivesse então em Florença.
Na quinta-feira 16 de junho, a Congregação do Santo Ofício tinha, a cada semana, sua reunião com o Papa. Nesta ocasião celebrou-se no palácio do Quirinal. Estavam presentes 6 dos 10 Cardeais da Inquisição, além do Comissário e do Assessor (nos interrogatórios e, em geral, em todas as sessões que foram mencionadas até agora,não estavam presentes os Cardeais: estavam os oficiais do Santo Ofício que transmitiam as atas à Congregação dos Cardeais, e estes, com o Papa, tomavam as decisões). Esse dia o Papa decidiu que Galileu fosse examinado sobre sua intenção com ameaça de tortura (neste caso tratava-se de uma ameaça puramente formal, já que se sabia de antemão que não se realizaria). Depois, Galileu devia abjurar da suspeita de heresia perante a Congregação em pleno. Seria condenado a prisão ao arbítrio da Congregação, seria proibido que no futuro tratasse de qualquer modo o tema do movimento da Terra, seria proibido o Diálogo, e seria enviado cópia da sentença aos núncios inquisidores, sobretudo ao de Florença, para que a lesse publicamente em uma reunião na qual procuraria que se encontrassem os professores de matemática e filosofia. O Papa comunicou esta decisão ao embaixador Niccolini em 19 de junho. Niccolini pediu clemência, e o Papa, manifestando algo que, como se apontou, estava já decidido de antemão, lhe respondeu que, depois da sentença, voltaria a ver o embaixador para ver como se poderia arrumar para que Galileu não estivesse na prisão. De acordo com o Papa, Niccolini comunicou a Galileu que a causa seria terminada em seguida e o livro proibido sem dizer-lhe nada sobre o que tocava a sua pessoa, para não causar-lhe mais aflição.
Desde a terça-feira 21 de junho até sexta-feira 24 de junho, Galileu esteve de novo no Santo Ofício. Na quarta-feira dia 22, Galileu foi levado ao convento de Santa Maria sopra Minerva; foi lida a sentença (assinada por 7 dos 10 Cardeais do Santo Ofício) e abjurou de sua opinião sobre o movimeto da Terra diante da Congregação. Foi, para Galileu, o mais desagradável de todo o processo, porque afetava diretamente a sua pessoa e se desenvolveu um público de modo humilhante. Na quinta-feira o Papa, com a Congregação do Santo Ofício reunida no Quirinal, concedeu a Galileu a prisão fosse comutada por arresto na Vila Médici, aonde se trastaladou na sexta-feira dia 24. Na quinta-feira dia 30 foi permitido a Galileu abandonar Roma e trasladar-se a Siena, na Toscana, ao palácio do arcebispo. Galileu deixou Roma na quarta-feira 6 de julho e chegou em Siena no sábado 9 de julho. Tinha acabado o pesadelo romano.
A sentença da Inquisição começa com os nomes dos 10 cardeais da Inquisição, e acaba com as assinaturas de 7 deles. O Papa, junto com a Congregação, decidiu que Galileu fosse condenado e que abjurasse de sua opinião, mas no texto da sentença não aparece em nenhm momento citado o Papa; portanto, esse documento não pode ser considerado como um ato de magistério pontifício, e menos ainda como um ato de magistério infalível nem definitivo. No texto da abjuração se lê - maldigo e detesto os mencionados erros e heresias - ; mas não se trata de uma doutrina definida como heresia pelo magistério da Igreja: no texto da abjuração se diz, como assim é, que essa doutrina foi declarada contrária à Sagrada Escritura, e, como sabemos, esta declaração se fez mediante um decreto da Congregação do Índex, que não constituiu um ato de magistério infalível nem definitivo.
O Arcebispo de Siena, Ascanio Piccolomini, era um antigo discípulo, admirador e grande amigo de Galileu. Tinha se oferecido várias vezes para se alojar em sua casa, tendo em conta, além disso, que estava relativamente perto de Florença e que em Florença ainda existiam vestígios da peste. Em Siena, Galileu foi tratado esplendidamente e se recuperou da tensão dos meses precedentes. A pedido do Grande Duque de Toscana, o Papa, junto com o Santo Ofício, concedeu em 1 de dezembro de 1633 que Galileu pudesse voltar a sua casa nas imediações de Florença, na Vila do Gioiello, contanto que permanecesse como em prisão domiciliar, sem sair daí nem ter uma vida social. Consta que em 17 de dezembro Galileu já estava em sua casa, e ali continuou até sua morte em 1642.
Em Arcetri Galileu continuou trabalhando. Ali acabou seus Discursos e demonstrações em torno de novas ciências, obra que publicou em 1638 na Holanda. Trata-se de sua obra mais importante, onde expõe os fundamentos da nova ciência da mecânica, que se desenvolverá neste século até alcançar 50 anos mais tarde, com os Princípios matemáticos da filosofia natural de Newton, obra publicada em 1687, a formulção que marca o nascimento definitivo da ciência experimental moderna.
3. PERGUNTAS E INTERPRETAÇÕES
Até aqui tentei expor os dados básicos do processo de Galileu. A partir deste momento me ocuparei da valorização deses dados. Dada a perspectiva que adotei, somente aludirei brevemente a alguns aspectos que considero especialmente interessantes.
Em primeiro lugar, podemos dizer que sabemos o fundamental so processo de Galileu?, é possível que existam dados importantes desconhecidos? A resposta é que os documentos que se conservam permitem reconstruir quase todos os aspectos do processo com grande confiabilidade. Possuímos os interrogatórios e declarações de Galileu em sua totalidade, assim como as decisões do Papa e da Congregação do Santo Ofício. Neste terreno, não é plausível que apareçam novos documentos que afetem substancialmente ao que já sabemos. Seguramente existem buracos, um deles, bastante importante, se refere aos acontecimentos do verão de 1632, desde que o Diálogo chegou Roma até que o Papa convocasse a congregação de teólogos para decidir o que fazer. Quem e como informou ao Papa? Galileu sempre considerou seu processo como conseqüência das informações tendenciosas de seus inimigos. É possível que existam documentos sobre esses acontecimentos, cujo conhecimento permitiria compreender melhor porque se desenrolaram do modo que o fizeram. Poderíamos saber, talvez, até que ponto as coisas poderiam ter acontecido de outra maneira. De todos os modos, isso não mudaria os fatos já conhecidos, entre os quais se conta que Galileu levou adiante, durante anos, seu programa copernicano, ainda que exteriormente perecesse ter renunciado a ele, e que Urbano VIII ficou muito afetado quando advertiu que seu admirado amigo estava, na realidade, fazendo um jogo diferente do que ele pensava.
Isto não significa que Galileu mentisse deliberadamente. Mas não há dúvida de que considerou o copernicanismo como uma teoria verdadeira, também depois do processo. Em sua carta a Cristina de Lorena explicou amplamente como se poderia solucionar a aparente contradição entre o copernicanismo e a Bíblia; tinha razão e o sabia: por este motivo podia admitir, com consciência tranqüila, o copernicanismo, inclusive depois das condenações de 1616 e 1633. O mesmo acontecia com seus amigos e com outras pessoas suficientemene informadas. O que nos leva a perguntar por que as autoridades eclesiásticas condenaram uma teoria que, se bem não estava completamente demonstrada naquele momento, podia demonstrar-se e, de fato, recebeu novas confirmações nos anos seguintes.
Para responder a essa pergunta devemos advertir que a ciência experimental moderna, tal como conhecemos agora, estava nascendo e se encontrava ainda em um estado embrionário. Precisamente foi Galileu um de seus pais fundadores. Mas o Galileu que viam as autoridades era muito diferente do que vemos agora, à luz do desenvolvimento da física durante quase quatro séculos. Galileu havia realizado descobrimentos astronômicos importantes e tinha sido reconhecido. Mas não podia provar o movimento da Terra. A ciência moderna praticamente não existia: as contribuições mais importantes de Galileu a essa ciência foram publicadas, nos Discursos, depois do processo. Os eclesiásticos (Belarmino, Urbano VIII e muitos outros), igualmente à maioria dos professores universitários, pensavam que o movimento da Terra era um absurdo, porque contradiz muitas experiências certas e, se existisse, deveria ter conseqüências que de fato não se observavam. Não era fácil levar a sério o copernicanismo. Os teólogos que valorizaram em 1616 a quietude do Sol e o movimento da Terra disseram, em primeiro lugar, que ambos eram absurdos de filsofia, além disso pareciam contrários à Bíblia. Belarmino, e outros eclesiásticos, advertiram que se chegasse a demonstrar o movimento da Terra, deveria-se interpretar uma série de passagens bíblicas de modo não literal; sabiam que isso poderia se fazer, mas pensavam que o movimento da Terra nunca seria demonstrado e que era absurdo. Isto não justifica toda sua atuação, mas permite situá-la em seu contexto histórico real e torná-la compreensível.
O processo de Galileu não deveria ser entendido como um enfrentamento entre ciência e religião. Galileu sempre se considerou católico e tentou mostrar que o copernicanismo não se opunha à doutrina católica. Por sua vez, os eclesiásticos não se opunham ao progresso da ciência; durante sua viagem a Roma em 1611, foi tributado a Galileu uma grande homenagem pública em um ato celebrado no Colégio Romano dos jesuítas, por suas descobertas astronômicas. O problema é que não consideravam que o movimento da Terra fosse uma verdade científica, e inclusive alguns (entre eles, o Papa Urbano VIII) estavam convencidos de que nunca poderia ser demonstrado.
Os inimigos de Galileu desempenharam, provavelmente, um papel importante para desencadear o processo. O termperamento muito vivo de Galileu não contribuía para apaziguar as numerosas disputas que originou seu trabalho desde 1610. Além disso, ele mesmo procurou inimizades de modo desnecessário, de tal modo que, quando o Diálogo foi publicado em 1632, é fácil imaginar que seus inimigos em Roma puderam apresentar ao Papa as coisas de tal maneira que, tendo em conta as difíceis circunstâncias pelas que atravessava UrbanoVIII, este se considerou ofendido por Galileu e viu ser necessário intervir com força. O temperamento de Urbano VIII também desempenhou um papel: tinha um caráter forte e pensou que Galileu tinha traído sua amizade sincera; repetiu várias vezes ao embaixador Niccolini que Galileu havia caçoado dele. Consta que, ao falar deste tema com Niccolini, Urbano VIII se encolerizava. Galileu certamente não pretendeu, de modo algum, caçoar do Papa, mas é provável que os inimigos de Galileu, no verão de 1632 convenceram ao Papa do contrário, e que isto influira seriamente no desenvolvimento dos acontecimentos.
Não se deve pensar somente em inimigos pessoais de Galileu. O movimento da Terra podia facilmente ser visto como causa de dificuldades importantes para o cristianismo. Se a Terra se transformasse em um planeta a mais, e se existissem muitas mais estrelas das que se vêem a olho nu, não poderia isto ser interpretado na linha de Giordano Bruno, quem afirmou que existem muitos mundos como o nosso, com suas estrelas e planetas habitados? Nesse caso, que significado teria a Encarnação e a Redenção de Jesus Cristo?, o que aconteceria com a salvação de possíveis seres inteligentes que poderiam viver em outros lugares do universo? São perguntas que, na atualidade, se propõem ainda com mais força do que então, frente a possibilidade, remota mas real, de que se chegue a saber que existe vida em outros lugares do universo. Em realidade, não é difícil advertir que a revelação cristã se refere diretamente ao que acontece conosco e, portanto, não há dificuldade em princípio para integrar dentro dela outros seres inteligentes. Além disso, a Igreja ensina que os frutos da Redenção se aplicam também a pessoas que viveram antes da Encarnação, ou que vivem depois dela e não conhecem, sem culpa sua, a verdade do cristianismo. Mas se compreende que estes problemas puderam influir naquele momento. A associação do copernicanismo com Bruno não podia favorecer a Galileu. Pode-se recordar que duas pessoas chaves na condenação do copernicanismo em 1616 foram o Papa Paulo V e o cardeal Belarmino; ambos eram Cardeais da Inquisição quando, em 1600, o processo de Bruno chegou a seu fim, e pode se supor que, ao pensar em copernicanismo, o veriam, por assim dizer, associados aos erros teológicos de Bruno.
O movimento da Terra parecia afetar ao cristianismo desde outro ponto de vista. O Diálogo de Galileu continha críticas muito fortes contra a filosofia de Aristóteles, que se vinha usando, ao menos desde o século XIII, como ajuda para a teologia. Nesta filosofia se admitia, por exemplo, que no mundo existe finalidade, e que as qualidades sensíveis existem objetivamente e são base do conhecimento humano. Estas idéias pareciam se arruinar com a nova filosofia matemática e mecanicista de Galileu. A nova ciência nascia em polêmica com a filosifia natural antiga, e não parecia poder preencher o buraco que esta deixava. Ainda que as críticas de Galileu ao aristotelismo se reduzissem a aspectos concretos da física que, certamente, deviam ser abandonados, parecia que a nova ciência pretendia jogar fora, como se costuma dizer, a criança junto com a banheira. Este problema segue sendo atual. Inclusive pode-se dizer que o progresso científico dos últimos séculos o tornou cada vez mais agudo. São muitas as vozes que pedem um sério esforço para integrar o progresso científico dentro de uma visão mais ampla que inclua as dimensões metafísicas e éticas da vida humana. Neste sentido, os que viam na nova ciência uma fonte de dificuldades não estava completamente errados. Obviamente, o problema não é a ciência em si mesma, de cuja legitimidade seria absurdo duvidar. O progresso científico é ambivalente e o fato de que possa se utilizar mal não significa que deva castigar a ciência simplesmente tento sublinhar que, no fundo do caso Galileu, encontram-se alguns problemas que são reais, continuam sendo atuais, e ainda esperam uma solução. Qual será o alcance do conhecimento científico é um desses problemas.
Consta que houve uma tentativa de denunciar a Galileu perante a Santa Sede por sua filosofia atomista, exposta brevemente em sua obra, de 1623, Il Saggiatore, argumentando que Galileu negava a objetividade das qualidades sensíveis (cores, odores, sabores) e que isto contradiz a doutrina do Concílio Trento sobre a Eucaristia, segundo a qual, depois da consagração, encontram-se as epécies sacramentais (acidentes do pão, como por exemplo as qualidades sensíveis) sem seu sujeito natural. Chegou-se a dizer que o motivo mais profundo da acusação contra Galileu em 1632 era este, e que o Papa conseguiu que o processo se centrasse em torno ao movimento da Terra, porque em outro caso as conseqüências teriam sido muito piores. A denúncia mencionada existiu, mas parece exagerada demais centrar aí os problemas de Galileu. Esta questão põe de manifesto, entretanto, que a nova física vinha acompanhada por uma filosofia mecanicista que, em parte, chocava com a filosofia e a teologia geralmente admitidas, e é certo que este problema continuou vivo durante muito tempo e inclusive continua vivo, em parte, na atualidade.
O caso de Galileu não afetou seriamente o progresso da ciência. A semente que Galileu plantou deu fruto imediatamente, também na Itália. Ao cabo de poucas décadas, Newton levou a física moderna até seu nascimento definitivo, e o trabalho de Galileu ficou bem assentado.
Por fim, é interessante assinalar que não existiu nenhum outro caso semelhante ao de Galileu. O caso de Galileu não é um caso entro outros do mesmo tipo. O caso mais semelhante é o do evolucionismo, mas a teoria da evolução, dentro de seu âmbito científico, nunca foi condenada por nenhum organismo da Igreja. Se se tenta colocar no mesmo nível que o caso de Galileu assuntos como o aborto, a eutanásia, a bioética, etc., deve-se advertir que, se bem esses problemas incluem componentes relacionados com a ciência, não são problemas propriamente científicos, mas, no máximo, de aplicação dos conhecimentos científicos. Mas isto exigiria uma reflexão específica que vai além dos objetivos a que me propus.
REFERÊNCIAS: Os dados deste artigo estão retirados, em sua maioria, da Edição Nacional das obras de Galileu, preparada por Antonio Favaro: Le Opere di Galileo Galilei, 20 volumes, reimpressão, G. Barbèra Editore, Firenze 1968. Os documentos do processo se encontram no tomo XIX, pp. 272-421, e também foram editados por Sérgio Pagano: I documenti del processo di Galileo Galilei, Pontifícia Academia Scientiarum, Cidade do Vaticano 1984.
Mariano ArtigasRetirado de
www.arvo.net.

Cristãos são os mais perseguidos do mundo, afirma autoridade vaticana

VATICANO, 31 Jul. 10 / 08:03 am (ACI).- O secretário do Conselho Pontifício para a Justiça e a Paz, Dom Mario Toso, denunciou que os cristãos se converteram no grupo religioso mais perseguido no mundo na ocasião de um encontro ante a Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE).

Segundo a informação divulgada pela agência católica AICA, Dom Toso presidiu a delegação da Santa Sé que nos dias 29 e 30 de junho participou da Conferência sobre a tolerância e a não discriminação, organizada pela OSCE, uma organização conformada por 56 Estados participantes, da Europa, Ásia Central e América do Norte (Canadá e Estados Unidos). No encontro prestaram particular atenção à discriminação contra os cristãos e membros de outras religiões.

"Com o crescimento da intolerância religiosa no mundo, está amplamente documentado que os cristãos são o grupo religioso mais discriminado", alertou o representante pontifício.
E acrescentou: "mais de 200 milhões deles, pertencentes a confissões diferentes, encontram-se em situações de dificuldade por causa de instituições e contextos legais e culturais que os discriminam".

Acima de tudo deixou claro que os cristãos não só são discriminados onde são minoria, mas também além se comprovou que em ocasiões seus direitos fundamentais são cerceados mesmo quando são maioria.

Inclusive na OSCE, afirmou monsenhor Toso, em alguns países existem ainda "leis intolerantes e discriminantes" contra os fiéis.
"Sucedem episódios repetidos de violência inclusive assassinatos de cristãos", advertiu o prelado.

"Com freqüência, a educação cívica tem lugar sem o devido respeito da identidade e a fé dos cristãos. registram-se, além disso, sinais claros de oposição ao reconhecimento do papel público da religião", constatou o arcebispo.

Por este motivo, sublinhou Dom Toso, "a Santa Sé está convencida de que a comunidade internacional deveria lutar contra a intolerância e a discriminação dos cristãos com a mesma determinação com a que luta ou lutaria contra o ódio contra todas as comunidades religiosas".

Por outra parte, assinalou, "os meios de comunicação tampouco ficam isentos de atitudes de intolerância e, em alguns casos, de denigrar os cristãos e os fiéis crentes em geral".
"Um autêntico pluralismo nos meios de comunicação exige uma correta informação sobre as diferentes realidades religiosas, assim como a liberdade de acesso aos meios para as mesmas comunidades religiosas".

No respeito da liberdade de pensamento e de expressão, o secretário pediu adotar "mecanismos e instrumentos contra a manipulação dos conteúdos e símbolos religiosos, assim como contra as manifestações de intolerância e de odeio contra os cristãos e todos os crentes".

Letra ilegível preocupa educadores

Até que ponto uma letra ilegível pode influenciar na vida de uma pessoa? A disgrafia, ou a síndrome da letra feia, é um tipo de transtorno que preocupa pedagogos. Mas os pais não precisam ficar tão preocupados.


"Lei das palmadas": saiba mais sobre a polêmica

Leonardo MeiraDa Redação
Arquivo
Diretor do Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre Matrimônio e Família, Dom João Carlos Petrini
Riscar palmadas, beliscões e outros castigos físicos da lista de estratégias que as famílias brasileiras usam para educar os filhos: esse é o objetivo do projeto de lei encaminhado pela Presidência da República ao Congresso Nacional no último dia 14 de julho, durante as comemorações dos 20 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)."O Estado não deve interferir em questões que dizem respeito à vida privada, da própria família, a não ser quando elas sejam efetivamente prejudiciais para o desenvolvimento do outro", o que não seria o caso das correções que envolvem castigo físico brando, afirma o diretor do
Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre Matrimônio e Família e Bispo auxiliar de Salvador, Dom João Carlos Petrini.O bispo acredita que o projeto seja um factoide, "criado para se tornar assunto de conversas", pois teria pouca utilidade em termos práticos, já que a legislação existente sobre esse aspecto [ECA] já seria suficientemente clara.O prelado também indica:"Ao invés de querer regulamentar minimamente esses aspectos da vida privada, o Estado deveria cultivar um processo de educação popular – através dos meios de comunicação e do exemplo das lideranças – que favorecesse um entendimento sério a respeito da vida. Vivemos um paradoxo, pois, de um lado, há projetos como esse, e, de outro, formas de agressão e desrespeito à vida, como o incentivo ao aborto", alerta.Leia mais.: Polêmica sobre o projeto de lei que proíbe palmadas nos filhosDocumentos.: Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).: Projeto de lei encaminhado pelo governo e que prevê as alteraçõesA psicopedagoga Josy Ribeiro explica que "se o pai e a mãe tem toda a potencialidade de acompanhar seu filho e educá-lo, o Estado não vai ter o conhecimento contextualizado acerca do comportamento daquela criança. É preciso deixar claro que, quando se é a favor da palmadinha, isso não significa dizer que se é a favor da agressão física".A atitude dos responsáveis pela criança deve ter como objetivo educar, formar, conduzir para uma forma de limite. "Se os responsáveis estiverem próximos, juntos, conversando, a palmadinha virá apenas após passar pela fase da conversa, do diálogo"."A criança está em um universo de descobertas. Ela não está com conceitos formados dentro dela. É à medida do que ela experimenta e vivencia que vai perceber o que pode ou não. Quem gerencia esse processo é o pai e a mãe. O grande problema é a ausência de muitos pais diante desse processo sistemático que a criança necessita", conclui.Saiba maisO texto apresentado pelo governo busca alterar a Lei 8.069/1990 (ECA), acrescentando o "direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos corporais ou de tratamento cruel ou degradante".O projeto define castigo corporal como "ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente”. Já tratamento cruel ou degradante abrange toda a “conduta que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize a criança ou o adolescente".A proposta é alvo de polêmica e debates entre os pais e especialistas. Segundo pesquisa do Instituto Datafolha divulgada na segunda-feira, 26, que ouviu 10.905 pessoas, 54% são contra o projeto e apenas 36% concordam com as mudanças. A margem de erro é de três pontos percentuais, para mais ou para menos.O texto também estimula uma ação integrada entre União, Estados e municípios na elaboração de políticas públicas, que teriam como principais ações: - promoção e realização de campanhas educativas; - inclusão nos currículos escolares, em todos os níveis de ensino, de conteúdos relativos aos direitos humanos e prevenção de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente; - integração com os órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, do Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente nos Estados, Distrito Federal e nos Municípios, Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, e entidades não governamentais; - formação continuada dos profissionais que atuem na promoção dos direitos de crianças e adolescentes; - apoio e incentivo às práticas de resolução pacífica de conflitos que envolvam violência contra criança e adolescente.Em caso de infração, as penas seriam as mesmas já previstas no ECA para pais, mães e responsáveis por cuidar de crianças e adolescentes.

Contra a traição não há vacina, só antídoto

Confiança é um artigo raro no “mercado” atual. Fomos condicionados a desconfiar de tudo e de todos, acreditando que todos são suspeitos até que se prove o contrário. O pior é quando lutamos, ultrapassamos essa ideologia e acabamos decepcionados pelas pessoas. Voltamos à estaca zero e, agora, voltar a confiar em alguém é muito mais difícil.
Isso se complica muito mais quando falamos de amizade. Um amigo é aquele que é nosso aliado, companheiro, protetor. Sendo assim, se nos deparamos com atitudes que contrariam essa definição natural, a decepção é muito maior. De um pai se espera proteção. De um amigo se espera aliança, confiança. Essa é a ordem natural e contrariá-la é criar feridas profundas em nossos corações.
Mas para isso não há vacina. Quem toma a firme decisão de amar alguém de verdade, também está colocando a sua "cara à tapa"; está se arriscando em se decepcionar, em ser traído. Quem ama se arrisca e, por se arriscar, se realiza, é feliz. Não tem jeito! Contra traição não há vacina, só antídoto.
Podemos chamar de vacina qualquer espécie de vírus atenuado que, ao ser introduzido no organismo, causa certas reações e a formação de anticorpos, os quais tornam o organismo imune àquele vírus. Não podemos imunizar o nosso coração contra as possíveis decepções de uma amizade, pois quem cria anticorpos contra a possibilidade de ser amado acaba morrendo. Com medo de ser traído, não se deixa mais amar, não ama e morre.
Mas se não existe vacina para a decepção, para a traição, existe antídoto. Um antídoto é um medicamento empregado com o fim de inativar a ação de outro; é um contraveneno. O melhor antídoto para qualquer decepção com um amigo é uma outra amizade. Só é curado de uma decepção quem se arrisca novamente e se permite também correr o risco de ser amado. Quem se abre a um novo relacionamento, se abre para ser cuidado, para amar, para estabelecer confiança, proteção, companheirismo. Para haver cura é preciso haver abertura, e não há melhor forma de ser curado do que amar e ser amado.
Pode ser difícil no começo, mas pouco a pouco, aqueles que corajosamente se arriscam no amor podem experimentar o seu poder curativo. Poderão ver de forma concreta que a cada passo que é dado as suas feridas vão cicatrizando. A possibilidade de amar e ser amado cria novos ares, novas esperanças em nossa vida. O coração é um músculo e para ele não atrofiar, o melhor exercício é amar.
Ninguém recomeça a amar sozinho. É difícil encaramos tantas feridas de uma vez só. Precisamos de ajuda, de Alguém que entenda o nosso processo e nos ajude em cada passo. Para isso não há um treinador melhor do que Deus: o próprio Amor. O Senhor sabe de nossos limites, das nossas dores, das nossas dificuldades. Ele mesmo foi traído e abandonado pelos amigos d'Ele. Mas a cruz que poderia se tornar, naquele momento, o maior sinal de abandono, com o Seu sacrifício, se tornou o maior ato de amor. Jesus experimentou as nossas dores, mas não parou nelas. É isso que Ele quer nos ensinar e por isso não nos deixa sozinhos. Ele vai conosco, supera os obstáculos, ensina-nos a perdoar e nos faz vencer no amor. Mas Ele não pode nos obrigar. Ele precisa da nossa decisão, da nossa abertura.
Talvez você tenha sido traído por um amigo e se fechou a outras possibilidades de amizade. Olhe para você e poderá perceber que seu coração está atrofiando. Peça ajuda ao Senhor e volte a amar. Abra-se novamente, dê esse passo. Pode até doer nos primeiros dias de exercício, pois seu coração estava muito tempo parado, mas depois ele vai ganhar ritmo e amar com toda potência. Deus está com você, como um Amigo, só esperando a sua decisão para ajudá-lo a superar. Recomece as suas amizades a partir do Senhor. Quem ama perdoa, supera e segue em frente. Arrisque-se novamente e experimente, em Deus, um novo começo, uma vida nova, a ressurreição do seu coração.
Seu irmão,
renan@geracaophn.com
Renan Félixrenan@geracaophn.comSeminarista da Comunidade Canção Nova, reside atualmente em Cachoeira Paulista (SP). Outros temas do autor: blog.cancaonova.com/renanfelix

As primeiras comunidades cristãs

O que mais impressiona nas primeiras comunidades é o fervor e a coragem dos cristãos. Diante das autoridades e dos líderes religiosos do seu tempo, os fiéis não temem confessar que Jesus é o Messias. A presença do Espírito Santo é muito viva. Cada igreja local tinha seus ministros, apóstolos, profetas, doutores... Todo o fiel recebia de Deus carismas especiais, que devia colocar à disposição da comunidade (dom de línguas, sabedoria, cura, ensino...).

A atuação feminina era expressiva, mas não havia confusão entre o papel do homem e o papel da mulher (a sociedade romana era muito machista e tratava a mulher como se fosse propriedade do marido; as crianças também eram desprezadas, podendo ser rejeitadas ou abandonadas à própria sorte pelo pai - tudo isto muda entre os cristãos). Em Cristo não há diferença de dignidade entre grego e judeu, homem e mulher, escravo (a sociedade romana era escravocrata) e livre. Todos se reuniam para celebrar a eucaristia (ou fração do pão) especialmente no domingo (que substituiu o sábado como o sétimo dia dos cristãos, por causa da ressurreição do Senhor), oravam em comum, partilhavam seus bens, ajudavam os pobres. O rito de iniciação cristã era o batismo, no qual os efeitos da morte redentora de Cristo eram aplicados sobre o crente. Havia ainda a imposição de mãos, ou Crisma, através da qual o fiel confirmava o seu compromisso e assumia uma missão na comunidade, e a unção dos enfermos, que servia para curar e confortar os doentes.

Uma fonte importante sobre a vida das comunidades cristãs do final do séc. I e início do séc. II é a Didaqué, ou Instrução dos Doze Apóstolos, uma espécie de catecismo primitivo. A primeira parte da Didaqué apresenta os dois caminhos que o homem pode escolher: o da vida e o da morte. Seguem-se orientações para a conduta dos fiéis e exortações. Na segunda parte há uma descrição da vida sacramental e da oração. O batismo é feito em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e, quando a imersão não é possível, a água pode ser simplesmente derramada três vezes sobre a cabeça de quem vai receber o sacramento. Os crentes devem jejuar duas vezes na semana e rezar o Pai Nosso três vezes por dia. A celebração dominical (Missa) é o sacrifício verdadeiro que cumpre a profecia de Ml 1,10s. Antes de se realizar a fração do pão os fiéis fazem uma espécie de ato penitencial (exomologese). A Didaqué também fala de apóstolos, profetas inspirados pelo Espírito Santo (os quais chama de sumo sacerdotes) e mestres que percorrem as igrejas. Bispos e diáconos são escolhidos pelos fiéis, com a mesma dignidade dos profetas e dos mestres. Por último, adverte contra os "falsos profetas e corruptores", e contra o anticristo que virá quando o fim estiver próximo. Aqueles que perseverarem na fé durante a grande tribulação serão salvos. Depois que o céus se abrirem, após o soar da trombeta e a ressurreição dos mortos, "o mundo verá o Senhor vindo sobre as nuvens do céu".

Sobre a penitência, já lemos no evangelho de João (Jo 20,21-23) que Cristo conferiu aos apóstolos o poder de perdoar pecados. Paulo, em sua primeira carta aos Coríntios, condena um caso de incesto e excomunga os responsáveis, esperando que com isto eles se arrependam e retornem para o Senhor. Na epístola de Tiago há uma exortação para a confissão dos pecados (Tg 5,16-18). Há casos, porém, de faltas graves para as quais se hesita em reconhecer a possibilidade de remissão (Hb 10,26ss; ver também a distinção que o apóstolo João faz entre pecados que levam à morte e pecados que não levam à morte, 1Jo 5,16). Quem renega a fé não encontrará misericórdia para seu crime, segundo o autor da carta aos Hebreus.

Os primeiros cristãos eram geralmente gente simples, das camadas sociais mais baixas. Exteriormente não se distinguiam das outras pessoas do seu tempo, mas viviam de modo honesto e digno. Procuravam ser obedientes às autoridades e oravam pelos governantes.

À frente de cada comunidade havia epíscopos, ou então um colégio de presbíteros. Havia também diáconos, que cuidavam da administração e da distribuição dos bens entre os necessitados. Tanto os epíscopos como os presbíteros e os diáconos eram ordenados através da imposição de mãos. Esta estrutura ministerial, ainda não muito precisa, deu origem à hierarquia da Igreja tal como a conhecemos hoje.

Com Santo Inácio de Antioquia as coisas ficarão mais claras: "Que todos, assim como reverenciam Cristo, reverenciem os diáconos, o bispo, que é a imagem do Pai, e os presbíteros, que são o Senado de Deus, a Assembléia dos Apóstolos". No início do século II, este regime se imporá naturalmente entre as igrejas da Ásia.

O que não se pode negar é que, desde os seus primórdios, a Igreja possui uma constituição hierárquica, formada pelos apóstolos e por Pedro, e que esta constituição foi transmitida sempre e ininterruptamente através do sacramento da Ordem. Os apóstolos fundaram comunidades e ordenaram pessoas para presidi-las. Estas, por sua vez, ordenaram outras como sucessoras, e o processo prosseguiu em uma cadeia contínua que permite ligar cada bispo, cada padre, cada diácono da Igreja de hoje aos apóstolos e, dos apóstolos, ao próprio Jesus Cristo.

De modo particular, o bispo de Roma é o sucessor do apóstolo Pedro e, portanto, responsável por garantir a unidade e a integridade da fé da Igreja.

Outra característica relevante dos primeiros cristãos era a ansiedade pelo retorno do Senhor, a Parusia. Pelas cartas de Paulo vemos que a volta iminente de Jesus era crença comum. Nas assembléias litúrgicas ouvia-se freqüentemente a exclamação cheia de esperança: "Maranatha! Vem Senhor Jesus!" Com o tempo percebeu-se que a vinda de Jesus não era tão iminente.

O cristianismo se aproveitou da imensa rede de estradas que interligava o Império. Desenvolveu-se principalmente no meio urbano. De boca em boca, através de escravos, mercadores, viajantes, judeus helenizados, artesãos, a Boa-Nova ia chegando aos lugares mais distantes. O Império de Roma tornou-se, logo, a "pátria do cristianismo"

Escola da Fé-Pe Paulo Resposta à protestante

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O Senhor do Aneis - História do Autor - JRR. Tolkien

Que autoridade prevalece?

Muito se fala no meio protestante da autoridade suprema da Sagrada Escritura, que ela é norma de fé, Palavra de Deus inspirada, etc. e que, por isso mesmo, deve ser crida infalivelmente. Que ela é Palavra de Deus, não resta dúvidas, que é infalível – por provir do próprio Deus, também não. Que lhe devemos todo o assentimento de fé, estamos de pleno acordo, da mesma forma que concordamos que a Escritura é normativa para o cristão. O grande problema não está aí, mas sim no fato de que os protestantes colocam a Escritura como única norma de fé e prática. Nós católicos, temos como norma próxima de fé o Magistério, que se apóia nas Escrituras e na Tradição. Até porque é o próprio Magistério que nos diz o que é Escritura e o que é Tradição. Se não fosse o Magistério, não saberíamos diferenciar o que é realmente Tradição daquilo que seriam somente contos, que livros são Escritura inspirada por Deus ou não. Foi o Magistério, inspirado por Deus, que pôde distinguir quais livros deveriam fazer parte do cânon bíblico e quais deviam ser rejeitados.
Calvino escreve a respeito da autoridade da Escritura nesses termos:
“Antes, porém, que se avance mais, é conveniente inserir certas considerações quanto à autoridade da Escritura, considerações que não só preparem os espíritos à sua reverência, mas também que dissipem toda a dúvida.” (CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã – Edição Clássica, p. 75, Editora Cultura Cristã, São Paulo, 2006).
Ele fala de fazer algumas considerações sobre a Escritura que dissipem toda a dúvida sobre essa questão. Mas ao contrário de desfazer as interrogações a respeito do tema, ele só as aprofunda e agrava, já que não as responde conforme veremos adiante.
A Escritura, é bom que tenhamos isso em mente, não apareceu por um toque de mágica, pronta, impressa, encadernada e acabada em nossas mãos. Para isso, na verdade, se percorreu um longo caminho. E esse caminho, passa inexoravelmente – goste Calvino [e os protestantes] ou não desse fato – pela autoridade da Igreja. Ele se refere a isso (a autoridade da Igreja de determinar o que é Escritura) dessa maneira:
“Tem prevalecido o erro, perniciosíssimo, de que o valor que assiste à Escritura é apenas até onde a opinião da Igreja concede... Depende, portanto, da determinação da Igreja, dizem, não só que se deve reverência à Escritura, como também quais livros devem ser arrolados em seu cânon. E, assim, homens sacrílegos, enquanto, sob o pretexto da Igreja, visam a implantar desenfreada tirania, não fazem caso dos abusos em que se enredam a si próprios e aos demais com tal poder de fazer crer às pessoas simples que a Igreja tudo pode” (Idem, p. 76)
Ele afirma que é errado sustentar a tese de que o valor da Escritura foi dado pela Igreja, de que foi a Igreja que determinou quais livros devem ser arrolados, que devemos veneração às Escrituras. Mas é muito mais fácil para ele falar tudo isso, do que responder de fato e de verdade às próprias alegações daqueles que ele diz defender absurdos. Ele falou que eles estão em tal erro, mas não o refuta. Antes prefere qualificar pejorativamente tais pessoas, como se elas estivessem ali somente para abusar da fé do povo, etc.
Então, ele diz:
“Mas, palradores desse gênero se refutam sobejamente com apenas uma palavra do Apóstolo. Categoriza ele [Ef 2,20] que a Igreja se sustém no fundamento dos profetas e dos apóstolos. Se o fundamento da Igreja é a doutrina profética e apostólica, é necessário que esta doutrina tenha a sua inteira infalibilidade antes que a Igreja começasse a existir.” (Ibidem)
Repare que, em duas frases, Calvino cria mais problemas que soluções. Vamos a eles. Primeiro ele assegura refutar somente com uma passagem o argumento das pessoas que advogam que a Escritura é decorrente da autoridade da Igreja, se referindo a Efésios 2,20. Vamos lê-lo:
“Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, tendo por pedra angular o próprio Cristo Jesus.”
Convém recordar aqui, que o contexto dessa passagem fala da plena cidadania na fé dos gentios (v. 12), que não são mais peregrinos, mas, antes, são membros da família de Deus (v. 19). Bom é lembrar ainda de mais passagens onde o grande São Paulo fala sobre a Igreja e seu fundamento. Ele assevera que a Igreja é “coluna e sustentáculo da verdade” (1 Tm 3,15). Ele não diz que a Escritura é a coluna e sustentáculo da Verdade, mas a Igreja. E por quê? Pelo simples motivo de que Nosso Senhor não fundou um museu literário, mas uma Igreja. E à Igreja deu a autoridade de zelar pela verdade, pelo ensino. S. Paulo mesmo escreveu a respeito disso em outro texto:
“Assim, pois, irmãos, ficai firmes e conservai os ensinamentos que de nós aprendestes, seja por palavras, seja por carta nossa.” (2 Ts 2,15)
Repare que aqui o apóstolo não fala de conservar somente os ensinos dados de forma escrita (a Escritura), mas também de guardarem o que ouviram por palavras. Isso é a Tradição oral da Igreja.
Mas voltando ao comentário de Calvino, ele cria outro problema além desse. Ele afirma que é necessário que a doutrina dos apóstolos tenha sua inteira infalibilidade antes que a Igreja começasse a existir. Oras, isso é um contrassenso, absurdo. Quer dizer que os apóstolos não fizeram parte da Igreja, então. Afinal ainda estavam ensinando, não havia como ter a inteira infalibilidade dessa doutrina segundo Calvino. Claro, pois eles ainda não tinham tido seus ensinos “testados” para ver se eram infalíveis. Mas, que ironia. Testados por quem? Não seria pela Igreja? Veja como ele cai em contradição no seu próprio argumento. A Igreja existiu e existia sim, antes do cânon estar fechado e acabado. Senão, haveria aí um vácuo de uns 200 a 300 anos pelo menos. É inconcebível pensar que até o ano 393 (quando se definiu o cânon do Novo Testamento) não tivesse existido a Igreja, segundo a tese de Calvino.
Ademais, ele não responde o óbvio: quem disse que os livros do Novo Testamento foram inspirados? Apareceu um anjo para ele, é? Negativo. A História mostra que o cânon do Novo Testamento, assim como do Antigo, foi definido no Concílio Regional de Hipona, em 393. Aliás, este concílio reafirmou a versão da Septuaginta, em resposta ao cânon do AT que alguns fariseus impuseram no sínodo de Jâmnia (100 d.C.) e que, por sinal, é o usado pelos protestantes. E foi um concílio feito por quem? Pela Igreja, oras. E mais tarde isso foi confirmado por toda a Igreja universal em outros Concílios regionais, como no Concílio Geral de Cartago (397) e vários outros Concílios posteriores, como o Ecumênico de Florença (1439-1445) e Trento (1545-1563). Interessante é que antes de todos esses concílios, já por volta do ano 200, a Carta Pascal de Santo Atanásio já trazia um Cânon do Novo Testamento quase idêntico ao cânon atual.
Antes de encerrar, queria ver uma última declaração de Calvino, para que se veja como ele evita ir ao ponto central da questão.
“Quanto, porém, ao que perguntam: como seremos persuadidos de que as Escrituras provieram de Deus, a não ser que nos refugiemos no decreto da Igreja? É exatamente como se alguém perguntasse: de onde aprendemos a distinguir a luz das trevas, o branco do preto, o doce do amargo? Pois a Escritura manifesta plenamente evidência não menos diáfana de sua veracidade, que de sua cor as coisas brancas e pretas, de seu sabor, as doces e amargas.” (As Institutas da Religião Cristã, p. 76)
Ele trata da questão como se não houvesse a menor necessidade de uma confirmação de que tais escritos são verdadeiramente Palavra de Deus. Antes, ele coloca de forma simplória que assim como vemos claramente a luz e as trevas, veríamos também que a Escritura é inspirada.
É tão meridiana e clara a questão, que entre os próprios reformadores houve divergência nesse ponto. Lutero tinha a epistola de S. Tiago como “epístola de palha”, não sendo digna, segundo ele, de figurar no cânon bíblico. Motivo? A epístola de Tiago não casa com a justificação somente pela fé tão pregada pelos reformadores. Simples. Ela foca as nossas obras (“a fé sem obras é morta” Tg 2,26) e importância delas na nossa justificação. O mais curioso aí, não é só o argumento – simplório e improcedente – de Calvino. Mas o mais revelador, é que nem nesse trecho e nem em outros ele responde essas questões.
O interessante é que, embora os protestantes critiquem a autoridade da Igreja, ao aceitar o cânon do Novo Testamento, eles implicitamente se sujeitam a essa mesma autoridade a que Calvino chamou de tirânica e sacrílega. Aí fica a pergunta que não quer calar: como eles sabem que o Evangelho de Tomé, de Maria Madalena, Felipe, Pedro, o Livro de Henoc não são inspirados? Um anjo lhes revelou isso? Ou eles se fiam no concílio de Hipona, onde foi definido o cânon do Novo Testamento? Se eles se fiam no concílio, pergunto: que autoridade, afinal, prevaleceu: a da Escritura por si mesma, ou a da Igreja que lhe confirma a inspiração e veracidade?
Juliana Fragetti Ribeiro Lima